DEM vai mudar estratégia eleitoral, diz Cesar Maia


Diante de um cenário de redução da bancada de seu partido, o DEM, no Congresso Nacional, o prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia, diz que a estratégia eleitoral do antigo PFL vai mudar. Se antes o partido arriscava menos ao lançar candidatos, nas eleições municipais deste ano, o caminho será disputar um maior número de prefeituras para puxar a recomposição da bancada.

Por isso mesmo, as eleições no Rio tem peso importante na estratégia de Maia, que almeja uma vaga no Senado em 2010. Maia não reconhece mas enfrenta um impasse para as eleições deste ano. O PMDB, ao qual o DEM se aliou no Estado, chegou a fechar acordo com um chapa encabeçada pelo candidato indicado pelo prefeito carioca e com vice peemedebista. Entretanto o governador fluminense, Sérgio Cabral Filho, rejeita essa aliança por configurar uma oposição ao presidente Lula, seu forte aliado, que refuta conversas com o DEM.

Nesta entrevista, Cesar Maia ironiza o apoio do presidente da República ao senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), pré-candidato à prefeitura do Rio. Avalia que a presença do Exército na construção de casas que Crivella está promovendo em favelas garante um trunfo eleitoral de peso ao senador.

No final do terceiro mandato, Maia acredita que o eleitor carioca, entretanto, tende a votar em políticos com perfil de administrador, assim como ele. E aposta na deputada federal, Solange Amaral para sucedê-lo. Derrotada na disputa pelo governo do Estado, em 2002, Solange amargou quarto-lugar com 9,9% dos votos. Em 2002, elegeu-se deputada federal com 101,4 mil votos.

Maia diz que não só vai eleger Solange mas também vai deixar o cargo bem avaliado pela população. "Hoje tenho um reconhecimento de ótimo/bom na casa de 34% a 35%. Ao final do terceiro ano (desse mandato) é bom", diz. Mas reconhece que tem uma rejeição que ele mesmo considera alta entre 26% e 27% mas justifica que a pesquisa foi feita num momento crítico, de queda de barreira e interrupção do trânsito num dos principais túneis da cidade. Considera que o ideal seriam 20%.

Diz que seu governo "tem pecados mas realizações" de obras públicas e mudanças administrativas com benefícios para os servidores públicos. Para ele, a rejeição também cresce porque a tendência do eleitorado é comparar às gestões anteriores. E após três mandatos a exigência da população aumenta, avalia Maia. Abaixo os principais trechos da entrevista.

Valor: Como o DEM está se preparando para as eleições municipais?

Cesar Maia: O DEM teve a maior produtividade sobre os outros partidos grandes para a Câmara de Deputados na relação entre número de candidatos apresentados e deputados eleitos. Só o PDT se aproximou da gente. Só que o DEM, como tem uma tradição de composição, tem uma quantidade de candidatos lançados menor do que os outros, do que o PMDB, do que o PSDB, do que o PT. E tendo produtividade maior, elege menos quantitativamente. Isso vai se corrigir. O DEM está sendo estimulado a lançar o maior número de candidatos possível para prefeitos e vereadores porque a gente vai testar essa produtividade, com o objetivo de eleger mais, o que significa mais deputados, obrigatoriamente. Com a base de prefeitos e vereadores maior, vai ter uma bancada maior de deputados também. Se cresce um, cresce o outro.

Valor: Qual a expectativa na disputa pela Prefeitura do Rio?

Maia: Vamos ter uma redução do número de votos no primeiro turno na Prefeitura do Rio, pois eu ganhei no primeiro turno (em 2004) e ninguém vai ganhar no primeiro turno nesta eleição. A Solange (Amaral, candidata do DEM) deve ir para o segundo turno. A queda no primeiro turno é forte porque sai de 50% dos votos, 2 milhões de votos, passa para 1,3 milhão para o segundo turno. São 700 mil votos a menos, que a nível nacional, têm um peso. Em 2006, o DEM teve uma vitória espetacular para o Senado, passou a ser o maior partido na Casa. Depois, tiraram um, tiraram outro, tiraram outro. Essa vitória sinalizava que o lugar que o governo iria ter problemas era no Senado. A gente viu isso agora na CPMF. Depois, o governo tem como carro-chefe político os programas de inclusão social. São programas que têm uma curva, que vai formando cada vez um ângulo menor. Sai de 6 milhões no Bolsa Escola e vai para 11 milhões no Bolsa Família. Depois, vai para 11,5 milhões, 11,7 milhões, não pode ir para 22 milhões. Os programas assistenciais têm sempre este problema. Quando recebe, a população dá um retorno muito grande porque recebeu aquele apoio. Se ele não está vinculado a um elemento de inclusão definitiva, a população começa a achar pouco logo depois. A pessoa ganha R$ 30, claro que é importante porque não ganhava nada. Só que daí a um ano R$ 30 não é nada, tem que ganhar R$ 150. Então, a produtividade política desses programas assistenciais é decrescente, o que é bom porque tem que acoplar um elemento de inclusão ao emprego, à Educação, à ascensão, uma porta de saída. Então, o governo Lula, nos programas assistenciais, vai ter, do ponto de vista político, uma produtividade política decrescente.

Valor: Mas não será um trunfo para o presidente a eleger o sucessor?

Maia: É outra questão. No Brasil, a eleição presidencial é de personagens. Não é de partidos políticos. O partido só é importante para dar tempo de televisão. O Lula é um personagem inimitável; o Fernando Henrique (Cardoso), não. O Serra é da família do Fernando Henrique, o Aécio é da família do Fernando Henrique, freqüentam os mesmos bares, as mesmas universidades, os mesmos livros. O eleitor percebe eles como da mesma família. Agora, da mesma família do Lula não há ninguém do PT.

Valor: A ministra Dilma Rousseff, possível candidata, é diferente...

Maia: Completamente diferente. Ela é da família do Fernando Henrique. Então o PT vai ter que ver como faz para que a população, em um personagem novo, completamente diferente do Lula, perceba o Lula presente nele. Não adianta o Lula ir para a televisão e dizer: "Esse é o meu candidato", isso não é assim.

Valor: Tem alguém mais próximo a ele?

Maia: Acho que não. Até porque, como vários querem, vai haver um retardamento da decisão do PT. O PT não vai conseguir terminar 2009 com candidato. Vamos supor que a Marta (Suplicy) seja candidata a prefeita de São Paulo e que ela perca a eleição. Acabou, vai ser candidata a deputada federal. Se ela ganhar a prefeitura, ela vai ganhar gás. O Patrus (Ananias) não vai se meter a candidato a prefeito de Belo Horizonte porque Belo Horizonte não é São Paulo e nem Rio, onde as eleições municipais são nacionais. Por maior importância que tenha, a eleição de Belo Horizonte é regional. O Patrus não vai para lá, ele é um dos candidatos para presidente. Talvez seja até, dentro do PT, alguém que dentro de uma comunicação política, consiga aproximar mais o personagem Patrus do Lula do que outros e não apenas em função dele ser o comandante do Bolsa Família, mas pelo jeito dele, caipira, simplório, aquela cara, que não é de Oxford nem de Cambridge ou de Harvard. Mas é questão interna deles. Um quadro da qualidade pessoal do Tarso Genro, estou tirando a política de lado, ele não se sente um pré-candidato? O Patrus, a Marta Suplicy, o (Ricardo) Berzoini... Então é um quadro que o PT vai ter muita dificuldade de desdobrar antes de 2010. E isso atrasa a construção de um personagem que se explique que é o sucessor do Lula.

Valor: O DEM vai ter candidato?

Maia: Sim, tem o Arruda (José Roberto Arruda, governador do Distrito Federal), tem o (senador) José Agripino (Maia, RN) e apareceu a (senadora) Kátia Abreu (TO), que foi o destaque da convenção (realizada em dezembro passado). Deram para ela a relatoria da CPMF e ela exerceu com enorme competência, ela cresceu em credibilidade no meio político e ela construiu como senadora uma oratória que ela não tinha como deputada. Ela tem a vantagem de estar no meio do mandato e portanto, faz campanha sem estresse.

Valor: O prefeito Gilberto Kassab (SP) é favorável ao DEM não ter candidatura para apoiar o Serra na disputa pela Presidência.

"(O Cabral) tem que fazer alguma coisa, ele recebe dinheiro do PAC, o Lula faz um monte de coisas para ele "

Maia: Isso é uma questão tática regional. Obviamente, ele tem que fazer isso. As chances de nós estarmos juntos com o PSDB em 2008 é que isso se resolva dentro do PSDB através do Serra. Então eu acho que o Alckmin corre o risco muito grande de se candidatar a prefeito de São Paulo.

Valor: Por quê?

Maia: Ele é um político jovem, já foi tudo - vereador, prefeito, deputado, governador, candidato a presidente da República, com 37% dos votos. Em qualquer pesquisa nacional, ele e o Serra estão iguais, não têm diferença. E ele vai para prefeito para um jogo de vida ou morte? Podendo ser escolhido governador de São Paulo, no lugar do Serra? Para ser prefeito e sair um ano e três meses depois para ser candidato a governador para poder perder a eleição? O eleitor em geral tem uma maneira de tomar uma decisão, que é diferente da maneira do intelectual, do empresário, que é mais racional. O eleitor não é assim, tem a vida dele, ele olha assim: "O doutor Alckmin, que eu gosto tanto dele, mas ele já foi tudo, podia ser nosso presidente. Será que ele vai ter entusiasmo para ser prefeito?". O Kassab tem sido um excelente prefeito, é, pela vida política dele, um homem que honra palavra e compromisso, que tem esse tipo de formação. O Serra tem visto isso e pode ser muito mais cômodo. Olha a saia justa: se o PSDB nos procurar e disser que apóia o Kassab em São Paulo em troca da vaga de vice em 2010, como a gente faz? A decisão nossa é ter candidato a presidente e isso é fundamental para o partido. Tendo candidato a presidente nós elegemos no mínimo mais dez deputados federais. Portanto, a gente vai lá para disputar a primeira bancada, o número 25 roda e facilita a campanha dos deputados estaduais e federais e governadores. Agora, o PSDB joga na mesa o Kassab, qual a reação que a gente vai ter? É um jogo para ser jogado.

Valor: E no Rio de Janeiro, sua base eleitoral, como vai ser a disputa pelas prefeituras?

Maia: O Rio de Janeiro, há 80 anos, tem dois vetores políticos. O populista, que pode ser de clientela, pode ser trabalhista com Getúlio (Vargas), pode ser social com (Leonel) Brizola, pode ser evangélico com (Anthony) Garotinho e com a Benedita (da Silva). Esse vetor é muito forte, sempre foi e continua sendo, está aí o Wagner Montes, o (senador Marcello) Crivella. E do outro lado, tem uma outra alternativa que o povo busca, não sei direito qual é o nome, na falta de um nome melhor, chamo de administrativo. Procura um perfil de candidato que faça mais o gênero do gestor, do administrador, isso tem aí há anos e vai se reproduzir agora. Já estamos em campanha com Solange Amaral. Quando o Crivella, habilmente, consegue levar o Exército para o Morro da Providência para fazer reforma de casa, passa a ter um discurso imbatível: "Atenção, vou fazer isso no Rio de Janeiro todo, vou com o Exército, a garantia de segurança e vou com a garantia de mão-de-obra". Quem pode dizer que é mentira? Ele fez ali. Então ele tem a oferecer um exemplo para o eleitor dele, que é imbatível. Mas como o Exército deixa se usar dessa maneira? Parabéns ao Crivella. E o documento do Exército é projeto Cimento Social, o nome do slogan dele.

Valor: O senador Crivella tem a simpatia do presidente Lula mas o PT quer lançar candidato.

Maia: O PT tem que ter para suas bases. O Lula, cada vez que trata de política do Rio de Janeiro, ele baba bílis. Não sei o que passou na cabeça dele. Ele quer porque quer derrotar a gente e ter um aliado dele na prefeitura, seja qual for, não interessa se é de esquerda ou de direita, se é evangélico ou católico, nada, ele quer eleger. E o Crivella é uma alternativa.

Valor: O senhor sempre disse que o Crivella tem um teto de votos. Isso pode mudar?

Maia: Não. No limite, ele passa... Ele vinha caindo na capital: se elegeu senador, se candidatou para prefeito, governador... Minha projeção, antes da entrada do Exército, é que ele iria cair mais ainda e iria acabar essa eleição com 10%. Mas com as imagens que ele está fazendo, com o Exército botando nos papéis "Cimento Social" e ele fazendo discurso para a base dele, recupera. Pode se recuperar para os 21% que ele teve em 2004 contra mim e deve ir para o segundo turno.

Valor: Como o senhor explica o movimento do governador Sérgio Cabral em lançar o Eduardo Paes pelo PMDB sendo que o partido tem aliança com o DEM?

Maia: É o Lula em cima dele.

Valor: O governador não reconhece essa aliança com o DEM.

Maia: Mas como? O acordo DEM-PMDB foi feito em 52 municípios e o Rio é um deles. O Cabral fez isso para a imprensa. Como o Cabral faz com o Lula em cima dele, babando bílis, dizendo que não pode apoiar candidato do Cesar Maia? Ele tem que fazer alguma coisa, ele recebe dinheiro do PAC, o Lula faz um monte de coisas para ele.

Valor: O senhor acha, então, que Eduardo Paes é para dar uma resposta ao presidente?

Maia: Não, o Cabral, na hora que trouxe o Eduardo Paes, trouxe confiante de que o poder do governador e do presidente da República ia virar. O que aconteceu? O Michel Temer (presidente do PMDB) disse que iria ficar com a direção regional do partido. E em seguida, houve uma intervenção no diretório municipal do PMDB. E estamos falando de três políticos que não são atropeláveis: Jorge Picciani (presidente da Assembléia Legislativa do Rio), (os deputados) Leonardo Picciani e Eduardo Cunha. E o movimento do Eduardo Paes do PSDB para o PMDB o fragilizou, ele traiu a sua imagem anterior. Não tem como carregar o Eduardo dentro do PMDB. Como diz o Picciani, eles podem, no limite, derrubar o acordo na convenção, mas não com o Eduardo. Pode ser com o (Marcelo) Itagiba (deputado). Porque ele (Eduardo Paes) vai perder a eleição, como perdeu agora para governador do Rio, teve votação pífia. E vai ter votos contra os deputados federais, que não digerem isso.

Valor: Fala-se que o senhor vai se candidatar ao Senado, em 2010.

Maia: Esse é o objetivo. Mas, no Brasil, tudo depende da conjuntura, a gente não sabe o que vai acontecer no dia de amanhã. Hoje, é isso. Vou levar minha biblioteca latino-americana para Brasília, construir um gabinete com pessoas que possam me ajudar a fazer resumo de leitura.

Valor: E o senhor pode vir a ser candidato a presidente da República?

Maia: Por que não? Eu vou passando num navio, estou em um navio, as pessoas caem no mar, eu salvo a vida de 30 pessoas e sai nos jornais "ex-prefeito salva 30 pessoas". Sou um herói, posso chegar em Sergipe e as pessoas vão dizer: você teve coragem, se jogou no mar. Não é uma construção que eu vá fazer, mas pode acontecer.


Valor Econômico

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