PF será “fiscalizada”

Em meio às críticas feitas aos supostos “excessos” da Polícia Federal nas últimas operações, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aprovou ontem, com poucas modificações, regras que disciplinam o controle externo da atividade da instituição. De acordo com a resolução, um procurador da República ou um promotor poderá vasculhar processos, requisitar e copiar documentos e ainda instaurar investigação contra policiais. A resolução irrita agentes e delegados da PF, que argumentam que as regras ferem a independência funcional da polícia. Entidades de classe já anunciaram que vão recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Além da PF, estão sujeitos à fiscalização as polícias Rodoviária Federal, Ferroviária Federal, Civil, Militar, Corpo de Bombeiros e também a Polícia Legislativa do Congresso. O controle externo da atividade policial já é um poder delegado ao MP pela Constituição e também está previsto na Lei Orgânica do MP da União. O relator da resolução, conselheiro Osmar Machado, explicou que alguns MPs estaduais já desempenhavam o papel e outros não. Por essa razão, era preciso uma regulamentação em caráter nacional. “Não há mordaça. O controle exercido pelo MP é finalístico, e não hierárquico. O procurador não será chefe do delegado. Ele fiscalizará se a investigação está observando os ditames legais”, argumentou.

A fiscalização aprovada pelo CNMP inclui o exame da regularidade e cumprimento de mandados de prisão, requisições e medidas determinadas pelo Ministério Público e pela Justiça, inclusive relativas a escutas telefônicas. Segundo a resolução, um delegado terá, por exemplo, que justificar por que desprezou boletins de ocorrência e não os transformou em inquéritos policiais. O objetivo será apurar possíveis omissões por parte dos policiais. Depois de publicada a resolução, os órgãos nos estados têm 90 dias para se adequar às novas regras. Institucionalmente, a PF evitou comentar o assunto. “Não vi o texto e só vou me manifestar após ter clareza sobre como o MP se propõe a exercer sua prerrogativa de controle externo”, disse o diretor-geral da PF, Paulo Lacerda.

Investigação
Um item em particular da resolução vem incomodando os delegados: o fato de um procurador ter o direito a partir de agora de abrir diretamente uma investigação contra um policial referente a um ilícito penal ocorrido durante o exercício da função. Segundo o presidente do Sindicato Nacional dos Delegados da Polícia Federal (Sindepol), Joel Mazo, antes da resolução, o MP tinha de requisitar à autoridade competente, como a corregedoria da polícia, a abertura de um processo contra o policial.

Para o presidente da Sindepol, a intenção da resolução é “boa”, mas alguns incisos são capciosos e se chocam frontalmente com a Constituição. Um desses itens, segundo ele, é aquele que permite o acesso dos integrantes do MP aos inquéritos antes de sua conclusão. Para rebater essa prerrogativa, as entidades devem questionar a resolução com uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal. Um dos argumentos é de que as medidas seriam típicas de controle interno das corregedorias, e não de controle externo.

Tanta polêmica tem como pano de fundo as antigas rusgas existentes entre o MP e a PF, principalmente em relação ao controle da investigação criminal. Segundo Mazo, a resolução teria por trás um objetivo antigo do MP, o de ter atribuição de instaurar e conduzir investigações criminais, atividade hoje restrita à polícia. A discussão está há anos no STF. Representantes do MP negam que haja essa motivação.

Memória
Uma briga antiga

A resolução aprovada ontem pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) está em discussão há meses e vem suscitando polêmica entre procuradores e policiais. Embora a medida do controle externo já estivesse prevista em lei, havia uma dificuldade para que delegados aceitassem as determinações legais, principalmente nos estados e no Distrito federal. Num episódio ocorrido há 10 anos em Ceilândia, o delegado não permitiu que promotores entrassem na delegacia, para fiscalizar a condução de um inquérito. O caso foi parar na Justiça e nada aconteceu.

A “briga” entre Polícia Federal e o Ministério Público é antiga e os conflitos tornaram-se comuns nos últimos dois anos. No ano passado, o conselho decidiu que integrantes do MP não precisavam de registro de arma autorizado pela Polícia Federal. A medida foi solenemente ignorada por policiais. O MP levou o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Procurador ganha apoio

O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, ganhou o apoio de 85% de seus colegas para continuar no cargo de chefe do Ministério Público Federal. Autor da denúncia do mensalão e também da Operação Hurricane, ele foi o mais votado na consulta realizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) para a escolha dos nomes que compõem a lista tríplice a ser entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O mandato de Souza termina no final de junho.

Se for levar em conta a experiência de outros anos, Souza deverá ser reconduzido por encabeçar a lista. Em seu primeiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva optou pelo candidato mais votado da lista, Cláudio Fonteles. Em 2005, mais uma vez Lula escolheu o primeiro lugar da ANPR: Antônio Fernando de Souza. Além disso, o procurador-geral está com prestígio no Palácio do Planalto. Os outros dois nomes que fazem parte da lista tríplice são dos subprocuradores Wagner Gonçalves e Roberto Gurgel.

Conforme estabelecido em norma constitucional, a nomeação do procurador-geral é de competência do presidente da República, após aprovação do nome pela maioria absoluta no Senado Federal. A escolha deve dar-se entre os integrantes da carreira maiores de 35 anos. (FG)

OAB questiona

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) informou ontem, por meio de nota, que vai analisar a constitucionalidade da decisão tomada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em relação ao controle externo das polícias. “A atividade de controle das polícias não pode resultar na sua perda de autonomia ou na transferência indireta da investigação criminal para o Ministério Público. A polícia exerce atividade de investigação, devendo ser autônoma, não podendo ser subordinada quanto a este aspecto ao Ministério Público”, afirmou o presidente da Ordem, Cezar Britto. “O controle previsto na Constituição é importante para evitar que a polícia exorbite do exercício da sua nobre função, evitando, inclusive, ações ou missões motivadas por interesse políticos ou para acobertamento de crimes. Não se poderá, a pretexto deste controle, transferir a investigação para terceiros”, concluiu.

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