Gilmar Mendes assume presidência do Supremo criticando o Presidente

Gilmar Mendes assumiu, ontem, a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) dizendo que a Corte se vê constantemente confrontada com casos de enorme responsabilidade política e econômica para o país e que a solução deve ser buscada levando em conta o equilíbrio nas relações com os Poderes Executivo e Legislativo.

Antes de Mendes discursar, o decano do STF, ministro Celso de Mello fez um discurso mais duro no qual defendeu o papel da Corte de corrigir desvios dos demais Poderes. Sem citar nomes, Celso de Mello disse, para uma platéia lotada de lideranças políticas e repleta de ministros, que os cidadãos têm direito a governos honestos. "O Estado deve ser gerenciado por homens íntegros, legisladores probos e juízes incorruptíveis."

Ao lado de Mendes, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ouviu as manifestações em silêncio, pois a tradição no tribunal não permite que o presidente da República fale na Corte. "Essa Suprema Corte não se curva a ninguém, nem permite excesso dos três Poderes", continuou Celso. Ele ressaltou que o STF desempenha as suas funções "de modo compatível e fiel que traçou a própria Constituição". "Nem se censure eventual ativismo judicial exercido por essa Suprema Corte."

O discurso de posse de Mendes teve um tom mais conciliador com o presidente Lula, que estava ao seu lado, e com a classe política. Ao falar do problema das edições de medidas provisórias, que levam ao trancamento da pauta do Congresso, Mendes pediu um diálogo político para se chegar a um modelo eficiente em que o governo não seja impedido de adotar MPs, nem o Congresso de apreciá-las. "É necessário que se encontre um modelo de aplicação das medidas provisórias que possibilite o uso racional desse instrumento, viabilizando, assim, tanto a condução ágil e eficiente dos governos quanto a atuação independente dos legisladores", disse Mendes, que na semana passada liderou uma votação contra a aprovação de créditos extraordinários ao Orçamento por MPs. "Os Poderes da República encontram-se preparados e maduros para o diálogo político inteligente, suprapartidário, no intuito de solucionar um impasse que, paralisando o Congresso, embaraça o processo democrático", completou o ministro.

O STF está a um voto de aceitar ação do PSDB e derrubar a MP que concedeu R$ 5,4 bilhões de créditos ao Orçamento.

Com relação ao Congresso, Mendes negou que haja uma judicialização da política. "Esta Corte tem a real dimensão de que não lhe cabe substituir-se ao legislador, muito menos restringir o exercício da atividade política." No ano passado, o STF decidiu que os mandatos dos parlamentares são dos partidos políticos, o que gerou protestos no Congresso, onde as trocas de partidos eram comuns. Pela decisão, os políticos que mudarem de legenda estão sujeitos à perda de seus mandatos. Além disso, o tribunal confirmou o direito de a minoria no Congresso abrir CPIs ao autorizar a CPI do Apagão Aéreo. Em outra decisão inovadora, o tribunal determinou a aplicação da Lei de Greve do Setor Privado às paralisações do funcionalismo, numa crítica ao Congresso que desde 1988 não regulamentou o assunto.

Para Mendes, o Supremo "está desafiado a buscar o equilíbrio institucional". Segundo ele, o país vive hoje uma "cultura judicialista", na qual todas as questões precisam passar pelo crivo judicial para serem resolvidas. "Por mais eficiente que se torne, o Judiciário não pode tudo", completou o ministro, ressaltando que cabe à esfera política a formulação de políticas públicas. Celso de Mello também defendeu o equilíbrio entre os Poderes, mas reforçou o papel do Supremo de coibir os abusos da classe política, pois é ele que, em última instância, verifica se os atos do Executivo e do Legislativo são compatíveis com a Constituição. "Nenhum órgão estatal pode, legitimamente, pretender-se superior ou supor-se fora do alcance da autoridade suprema da Constituição Federal", disse o decano do STF. "É importante reconhecer e reafirmar que nenhum Poder da República está acima da Constituição e das leis. Nenhum órgão do Estado - situe-se ele no Judiciário, no Executivo ou no Legislativo - é imune ao império das leis e à força hierárquico-normativa da Constituição."
A posse de Gilmar Mendes reuniu, pela primeira vez, os ex-presidentes José Sarney, Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, e o presidente Lula. Pouco antes de entrar no plenário do STF ao lado do governador de São Paulo, José Serra, e do ministro da Defesa, Nelson Jobim, FHC disse que quem decide sobre as MPs é o Supremo. FHC afirmou ainda que é lamentável o episódio do suposto dossiê que teria sido feito pela Casa Civil sobre os seus gastos particulares. "Não quero entrar neste assunto que é realmente lamentável. O Brasil não merecia passar por este tipo de coisa tão baixa. Prefiro não comentar."

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