Sálarios sobrem mais que a produtividade


Os salários cresceram em ritmo superior ao da produtividade na indústria de transformação no primeiro trimestre, na contramão da tendência registrada no acumulado dos 12 meses até março. Nos primeiros três meses de 2008, o custo do trabalho teve alta de 0,43% em relação ao mesmo período do ano passado, refletindo a comparação do crescimento de 3,77% da folha de pagamento no período, já descontada a inflação, com o aumento de 3,24% da produtividade. Nos 12 meses até março, o custo do trabalho teve queda de 1,34%.

Os analistas notam que a alta no trimestre é muito influenciada pelo comportamento do setor de coque, refino de petróleo, combustíveis nucleares e álcool. O segmento viu seu custo do trabalho crescer 21,16% no período. "Se for excluído esse segmento, o custo do trabalho na indústria de transformação teve queda de 1,5% no primeiro trimestre, e não alta de 0,43%", diz o economista Bráulio Borges, da LCA Consultores.

O professor da Unicamp Edgard Pereira, da consultoria Edgard Pereira & Associados, avalia que a alta do custo do trabalho no primeiro trimestre foi de fato influenciada pelo desempenho ruim de alguns setores, como o de coque e refino de petróleo, combustíveis nucleares e álcool, mas acredita que o tempo em que o aumento da produtividade acomodava com tranqüilidade elevações de custos salariais ficou para trás. "O alívio não deverá ser tão grande como era há alguns meses", afirma Pereira, que não vê, entretanto, uma fonte de pressão inflacionária preocupante vinda do mercado de trabalho.

A produtividade da indústria de transformação teve alta de 4,24% nos 12 meses até março. No primeiro trimestre, esse indicador de eficiência aumentou 3,32%. No caso da folha de pagamento em termos reais (acima da inflação), houve uma trajetória inversa: nos 12 meses até março, o crescimento foi de 2,89%, e nos três primeiros meses de 2008, de 3,77%. Foi a combinação de uma produtividade mais fraca com reajustes salariais mais fortes que resultou no aumento do custo de trabalho no primeiro trimestre. Pereira lembra que os números refletem o bom momento do mercado do trabalho, marcado pela elevação do emprego e da renda.

No caso do setor de coque, refino de petróleo, combustíveis nucleares e álcool, a folha de pagamento subiu 7,41% no trimestre. Comparada à queda de 11,35% da produtividade, resultou no aumento de 21,16% do custo do trabalho. Borges ressalta que a produção no segmento tem sido frustrante - avançou apenas 1,64% nos três primeiros meses do ano, refletindo em parte a paralisação numa refinaria de petróleo em março. Ao mesmo tempo, o número de horas pagas aos trabalhadores pelas empresas do setor cresceu 14,66%, combinação que explica o tombo da produtividade.

Mas esse não foi o único setor a registrar aumento do custo do trabalho na indústria de transformação, que responde por 95% de toda a produção industrial. O setor de minerais não-metálicos viu a sua produtividade crescer 6,85% no primeiro trimestre, um avanço significativo, mas inferior à alta de 11,85% registrada pelos salários. Com isso, o custo do trabalho subiu 4,98% de janeiro a março. Outros segmentos que amargam elevação forte são os de metalurgia básica (6,6%) e o de produtos de metal (8,4%).

Pereira chama a atenção ainda para o setor de máquinas e equipamentos. Nos 12 meses até março, o custo do trabalho ainda acumula queda de 11,36%, mas no trimestre o tombo se limita a 1,37%. A produtividade, que sobe 6,24% nos 12 meses até março, caiu 3,24% no trimestre. E vale notar que o segmento continua a produzir muito - alta de 11,41% de janeiro a março -, mas o ritmo está inferior à expansão do número de horas pagas, que cresceu expressivos 15,34% no período. Para Pereira, o comportamento do custo do trabalho no setor deixa claro que a situação não é tranqüila como foi há alguns meses.

Vários segmentos, porém, ainda mostram um resultado bastante positivo. Um dos grandes destaques é o de fabricação de meios de transporte, que inclui a indústria automobilística. No primeiro trimestre, o custo do trabalho caiu 4,39% em relação ao mesmo período do ano passado. A folha de pagamento cresceu 2,8% acima da inflação, bem menos que a alta de 7,53% registrada pela produtividade. E o ganho de eficiência no setor foi obtido de modo virtuoso, com aumento simultâneo de produção (20,5% de janeiro a março) e do número de horas pagas aos trabalhadores (12,13%).

Para o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, a alta do custo do trabalho "obviamente não é um alívio para a inflação", mas não é daí que vêm as maiores pressões sobre os índices de preços. O comportamento das commodities preocupa muito mais. "Num momento em que as empresas estão sofrendo aumentos de custos por todos os lados, fica difícil imaginar grandes repasses salariais na indústria", afirma ele, lembrando que "já não é tão simples repassar preço para o produto final", mesmo com as pressões das altas de insumos.

Na indústria geral, o custo do trabalho ficou praticamente estável no primeiro trimestre, com queda de 0,09%, influenciada pelo tombo de 9,58% das indústrias extrativas. Esse segmento representa apenas 5% da produção industrial total, mas a magnitude do recuo acabou por jogar para baixo o custo do trabalho de toda a indústria.

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