Ações judiciais emperram o PAC


Uma enxurrada de ações judiciais contra obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) pode abalar os planos do governo para combater os efeitos da crise neste ano. Dados da Advocacia-Geral da União (AGU) mostram que o volume de questionamentos avançou 702% de janeiro a setembro de 2008 comparado ao mesmo período de 2007. No total, foram 931 ações, o que representa média mensal de 103,4 ações ante 12,89 até setembro de 2007.

Se o ritmo registrado até setembro manteve-se nos últimos meses, o País deve ter registrado em 2008 mais de 1.200 ações contra as obras de infraestrutura. A expectativa é que os números cresçam ainda mais com a inclusão de novos projetos no PAC, que somará R$ 1,1 trilhão de investimentos até 2010, segundo a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil). A intenção do governo é usar o PAC turbinado para garantir um crescimento de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2009.

Entre os empreendimentos que vão compor a nova carteira de investimentos estão o trem-bala, concessões rodoviárias, projetos portuários e expansão de ferrovias. Todos eles exibem uma complexa engenharia de construção que pode dar margem a questões na Justiça. Uma delas está associada à desapropriação de terras onde as obras serão instaladas. O trem-bala, por exemplo, cujos investimentos somam US$ 11 bilhões, terá mais de 500 km de extensão e envolve áreas privadas, inclusive em trechos urbanos a serem desapropriados.

Em 2007, esse tipo de disputa representou 47% do total. Em 2008 subiu para 61%. As obras da ferrovia Nova Transnordestina, que somam investimentos de R$ 5,4 bilhões, estão atrasadas em um ano, especialmente por problemas na desapropriação das áreas onde serão instalados trilhos com extensão de 1.728 km nos Estados do Ceará, Pernambuco e Piauí - responsáveis pela desapropriação das terras.

A construção da Transnordestina, cujo primeiro projeto surgiu na década de 50, está sob responsabilidade da Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN), do grupo CSN. As obras foram iniciadas em junho de 2006 numa solene cerimônia com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na ocasião, o presidente Lula afirmou em discurso que o empreendimento seria a "redenção do Nordeste". Mas, de lá pra cá, pouca coisa mudou. O cronograma de conclusão previsto para 2010 já está comprometido.

Outro empreendimento do PAC que sofreu com as disputas judiciais foi a Hidrelétrica de Estreito (584 MW), entre Maranhão e Tocantins. Concedida em 2002 aos grupos Suez, Camargo Corrêa, Vale e Alcoa, a usina deverá iniciar operação em setembro de 2010, depois de superar uma série de desafios.

No total, foram sete ações civis públicas questionando vários pontos do empreendimento, como a licença ambiental e o leilão de concessão realizado há seis anos. Umas das ações reivindicava a realização de um estudo de impacto ambiental que abrangesse as barragens da Hidrelétrica de Lajeado (TO) até Tucuruí (PA), numa distância de cerca de 700 km. Estreito fica no meio das duas usinas.

"Muitas ações se repetem e vão contra a lógica do mercado. Mas elas perdem o sentido quando mostramos como nosso trabalho é sério", afirma o presidente do Consórcio Estreito Energia (Ceste), José Renato Pontes. A cada ação envolvendo obras do PAC, entra em ação um batalhão de técnicos e advogados de órgãos, como agências reguladoras e ministérios, da Procuradoria da República e das empresas para tentar suspender a liminar e evitar que as obras sejam paralisadas.

PREJUÍZOS

Embora a maioria das decisões seja derrubada, a iniciativa muitas vezes interrompe as obras e representa enormes prejuízos para empresas e para o País. Isso tudo ocorre apesar da dificuldade e do tempo para conseguir o licenciamento ambiental dos projetos. No caso de Estreito, a licença prévia foi liberada depois de três anos de análise. O presidente do consórcio pondera, entretanto, que a usina foi concedida com base em regras antigas. Hoje, qualquer usina só pode ser licitada se houver licença prévia liberada, o que facilita o processo.

Mas não só as usinas licitadas que são questionadas judicialmente. Os estudos de viabilidade e os inventários de rios, que determinam onde construir as usinas, também são paralisados por decisões judiciais. Em alguns casos, os técnicos são proibidos até de iniciar os estudos. Liminares impedem até a realização de audiências públicas para explicar os projetos às comunidades.

"Precisamos fazer uma blitz para tornar viável os empreendimentos hidrelétricos no País", diz o presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, referindo-se à dificuldade para conseguir levantar esses projetos e à disseminação de usinas movidas a óleo diesel e óleo combustível.

Nos empreendimentos rodoviários, a situação não é diferente. Na BR-101, num trecho localizado em Santa Catarina, os donos de uma lanchonete entraram na Justiça para pedir indenização por danos morais e materiais. Mas o governo conseguiu reverter a situação e as obras continuaram.

A "judicialização" pode elevar o custo das obras em até 2,7% e a demora no licenciamento ambiental em 8,3%, segundo especialistas. Por isso, associações e empresários brigam para diminuir o número de ações judiciais, sem comprometer a sustentabilidade das obras ou passar por cima da legislação.

Em alguns casos, porém, os próprios investidores dão brechas para contestações, como a apresentação de projetos inadequados e briga entre concorrentes no caso de licitações.U

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