Tenda para morador de rua só tem TV
“Nem eu, que durmo em qualquer canto, tenho coragem de tomar banho num lugar daquele”, afirma o morador de rua José Cândido, que no último dia 25 passou o dia estirado com um grupo de colegas no chão da Praça da Sé. Ele faz referência ao Espaço de Convivência Jardim da Vida, equipamento conveniado com a Secretaria Municipal de Assistência Social (Seads) instalado no Parque Dom Pedro II, no centro. “E todos aqui concordam comigo”, completa, apontando para os amigos, que confirmam com a cabeça.
A inauguração do Jardim da Vida, em julho do ano passado, foi alardeada pela Seads. Na época, a secretária e vice-prefeita, Alda Marco Antonio, prometeu que no local haveria chuveiros, oficinas de arte, serviços de escritas de cartas e 15 educadores sociais para encaminhar usuários para atendimento médico. Os moradores de rua poderiam entrar nos programas de transferência de renda da Prefeitura e, se quisessem, dormir no local durante o horário de funcionamento ou à noite.
A proposta original da tenda, porém, não foi cumprida. O serviço se limita a oferecer aos usuários, apenas das 8 às 21 horas, uma TV, cadeiras de plástico e 12 banheiros químicos com chuveiro. Dentro dela, dezenas de moradores passam a tarde dormindo no chão. Também não é oferecida nenhuma refeição, como bolachas ou sopa - a principal crítica de quem recebia alimentação nos albergues e hoje não tem mais um leito para dormir. “Em nada adianta dar banho para o sem-teto e, depois, jogá-lo na rua novamente, sem comida e sem cama”, reclama Anderson Miranda, coordenador do Movimento Nacional da População de Rua.
Miranda menciona a principal reclamação dos movimentos de moradores de rua: nos últimos dois anos, a Prefeitura fechou dois albergues no centro e agora pretende fechar outros dois. Como mostrado em reportagem de ontem, serão quase mil vagas a menos na região. “O que a Prefeitura está fazendo é fechar os albergues para higienizar o centro e, para não dizerem que não pensam na população de rua, criam essa tenda imunda no Parque Dom Pedro. Já encontrei até fezes no chão daquele lugar.”
A falta de higiene do local é consenso entre os usuários. “Já estamos até acostumando com o banheiro sujo”, diz o morador de rua Rafael Manoel Reis. A higiene dos banheiros é realmente péssima. Ontem, a reportagem visitou o Jardim da Vida às 13h30 e flagrou fezes espalhadas nas proximidades dos banheiros e ao lado da tenda.
“Não dá para se reestruturar sendo tratado em uma área imunda”, afirma o sociólogo Rubens Adorno, doutor em Saúde Pública e professor da USP. No ano passado, a Seads prometeu entregar outros dois espaços similares ao Jardim da Vida. Mas essa meta ainda não foi cumprida. Jornal da Tarde
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