Falta de corpos para estudo. Cadáveres em mau estado de conservação, armazenados em caixas-d'água ou baldes. Denúncias de descarte de substância tóxica na rede pública de esgoto e salas novas sem uso.
Essa é a situação do ICB (Instituto de Ciências Biomédicas da USP), um dos maiores da universidade, com dez mil matrículas, responsável pelas aulas básicas dos cursos de saúde, como medicina e odontologia.
As condições da escola provocam críticas de alunos e docentes -e viraram objeto de investigação do Ministério Público.
Para parte dos integrantes do instituto, as condições atrapalham as atividades pedagógicas do curso de anatomia, pois os cadáveres estão tão desgastados que não é possível identificar algumas estruturas do corpo.
A Promotoria classificou como "um desrespeito" a forma de armazenamento de cadáveres. Um inquérito está em curso, que pode produzir ação judicial para exigir melhorias.
Os dirigentes do instituto afirmam que não há problemas pedagógicos. E a forma de conservação de cadáveres, dizem, "é normal" nas escolas médicas.
Como a USP não participa de avaliações federais, não é possível comparar a qualidade dos seus cursos com os demais.
Equipamento quebrado
As peças humanas estão em baldes e caixas-d'água porque a estrutura de aço inox comprada em 2006, por R$ 56 mil, não aguentou o peso dos corpos. O instituto busca ressarcimento e novas peças para reposição.
"É inadmissível o tratamento dado aos cadáveres", afirmou à Folha o promotor Arthur Pinto Filho, que apura o caso. Em fotos encaminhadas à Promotoria, aparecem partes de corpos dentro de um balde, junto com pedaços de plástico.
"Como ensinar respeito ao paciente se guardamos o cadáver assim? Somos a USP, devíamos dar exemplo", disse Esem Cerqueira, um dos docentes de anatomia da escola. Cerqueira fez as denúncias à Promotoria.
O professor reclama do estado dos corpos utilizados nas aulas. Sem recursos e com dificuldades burocráticas, a escola não recebe novos cadáveres desde 2008. A Unifesp, por exemplo, recebe ao menos um ao ano.
O docente diz que há corpos sendo usados há mais de seis anos. "O aluno mal consegue ver que parte está estudando."
Os cadáveres usados nas escolas são de indigentes ou doados pela família. No primeiro caso, são necessários cerca de R$ 10 mil para a utilização. A instituição precisa fazer anúncios em jornais, à espera que um familiar reclame o corpo.
"Os alunos são obrigados a estudar em material antigo, o que prejudica gravemente o ensino. A anatomia é um aprendizado muito visual", afirma o centro acadêmico de medicina. "Por dificuldade burocrática, falta de organização ou de interesse, o departamento de anatomia sofre com falta de cadáveres."
Outra crítica feita pela Promotoria é quanto ao uso do formol para conservar os corpos. O promotor diz que a substância, considerada cancerígena, poderia ser substituída por glicerina em parte dos casos -esta não traz riscos, mas é mais cara.
A escola foi advertida pela Vigilância Sanitária por lançar o formol, ainda que diluído em água, na rede de esgoto. A Secretaria da Saúde disse que a escola está resolvendo a questão.
Além disso, um laboratório e um anfiteatro ficaram prontos há um ano, mas não funcionam por falta de equipamentos.Folha
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