PT x imprensa (de novo)

O PT mais uma vez mobiliza-se contra a imprensa. Considera-a uma facção partidária de oposição e quer meios de controlá-la. Apresentará uma moção nesse sentido em seu 4º congresso.
Quer o fim da propriedade cruzada em veículos de comunicação (ninguém pode ter mais de um tipo de veículo), a “democratização da mídia” (com censura?) e a “quebra do monopólio” (que não existe no Brasil em nenhum segmento da mídia).

É uma nova escaramuça, já experimentada sem sucesso durante o governo Lula, quando espantosamente foi vinculada à defesa dos direitos humanos.

A tentativa anterior estava inscrita no Plano Nacional de Direitos Humanos, que legitimava ainda a invasão de terras e a supressão de símbolos religiosos, entre outras humanidades.

A presidente Dilma, quando candidata, chegou a subscrever, em seu primeiro programa de governo, aquelas propostas. Mas, diante da reação, alegou não as ter lido e jurou que não as aprovaria. É uma boa oportunidade de confirmar sua palavra.

Agora, o epicentro é uma matéria de Veja, que revela o bunker político do ex-ministro José Dirceu, num hotel em Brasília, considerada pelos petistas (e, óbvio, pelo próprio, Dirceu) uma afronta à sua privacidade. A imprensa estranhamente não repercutiu a matéria, que, no entanto, não é irrelevante.

Mostra uma espécie de governo paralelo montado na capital da República. Pode não constituir um crime um ex-parlamentar cassado e sub judice na mais alta corte do país, acusado de corrupção, receber ministros e lideranças parlamentares reservadamente.

Mas, do ponto de vista político, é no mínimo uma quebra de normalidade, anomalia mesmo, se se considerar de quem se trata, de alguém que notoriamente exerce liderança somente comparável à de Lula sobre o principal partido da base governista, o PT, cujo presidente, Rui Falcão, segue sua orientação.

O próprio Dirceu, já cassado e sub judice, confessou, numa célebre entrevista à Playboy, que um pedido seu – um consultor privado de empresas - ao governo não é um “pedido qualquer”: é “Um pedido. Leia-se “uma ordem”.

Acresce que os encontros se deram em meio à crise política que derrubou Antonio Palocci, cuja origem se atribui ao próprio grupo de José Dirceu. Ele alega que, não sendo do governo, tem direito não só à privacidade profissional, como a receber quem quiser. Depende. Quando essas consultorias envolvem o Estado, tudo muda.

Ele tem, entre seus clientes, empresas ligadas ao setor do petróleo. E, entre seus visitantes, estava ninguém menos que o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, o que, no mínimo, sugere tráfico de influência. Quem sabe ele lhe fez ali “Um pedido!”?

Os delitos políticos, em regra, transcendem os judiciais. Fernando Collor foi deposto pelo Congresso, mas absolvido pelo Supremo Tribunal Federal. Ao Congresso, bastou a certeza de que havia atentado contra o decoro da função; ao Supremo, era preciso demonstrá-lo não apenas com documentos, mas com conexões causais, não obtidas.

A atividade política tem (deveria ter) uma instância moral com eloquência própria, que dispensa formalidades jurídicas. A Câmara, por exemplo, deveria ter cassado Jaqueline Roriz mediante o vídeo que a mostra embolsando dinheiro de origem no mínimo duvidosa (embora ninguém tenha dúvidas de sua procedência).

Não o fez porque não quis, não pelos motivos alegados (de que teria delinquido antes da aquisição do mandato). Já o Judiciário, para condená-la, precisa de provas materiais: elementos palpáveis que confirmem a origem espúria do dinheiro.

O Congresso cassa pelo decoro, algo frequentemente imaterial – um gesto, uma palavra. Richard Nixon, por exemplo, caiu porque, acima de tudo, mentiu ao povo americano.

O Judiciário lida com situações materiais, comprováveis por documentos, confissões, testemunhos. Dentro disso, não há problemas com o bunker de Dirceu. Já pelo ângulo político, trata-se de uma desfaçatez, um desafio a céu aberto a um governo legitimamente instalado, submetido à ação sabotadora de um grupo.

Não vem ao caso a culpa de Palocci, que mereceu o destino que teve, mas certamente não foi por essa razão que o grupo de Dirceu o alvejou. Se a cruzada fosse moral, metade do ministério iria para a rua, junto com alguns visitantes do bunker. A ação teve como objetivo atingir o governo para nele exercer maior influência. E isso, por si, é notícia, no entanto desprezada pelo conjunto da mídia.

Mesmo considerando-se que tivesse havido excesso, não justificaria uma ação contra a liberdade de imprensa ou o advento de nova legislação. O Código Penal oferece ao PT e a José Dirceu os meios de reclamar reparação, por injúria, calúnia ou difamação, únicos crimes decorrentes da ação da imprensa.

Por que não o acionam? Talvez, nessa instância, não disponham dos meios necessários para configurar o que dizem.

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