“Puxão de orelha” em Devanir


Em reunião com Ricardo Berzoini, Arlindo Chinaglia e o autor da proposta do terceiro mandato, o presidente Lula manda pôr um ponto final na discussão do tema. Consulta popular também vai ser descartada

Cansado de mandar recados aos aliados, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentou ontem colocar um ponto final nos debates e articulações do terceiro mandato. Ele reuniu, no Palácio do Planalto, o presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini e o presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT-SP), além de um dos defensores da consulta popular sobre a reeleição, o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP). Lula foi taxativo ao dizer que a discussão sobre mudanças como essa na Constituição só prejudica o governo, em especial no momento em que tenta aprovar a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) até 2011. O presidente pediu ao trio que enterrem a discussão sobre o terceiro mandato.

A conversa surtiu efeitos. Mesmo negando qualquer intenção de desistir do projeto que pretende conceder poderes ao presidente da República de convocar plebiscitos — para tratar de temas polêmicos —, o amigo de Lula e deputado Devanir Ribeiro mudou o tom da proposta. Ele admitiu a possibilidade de incluir no texto do projeto a proibição para que um possível terceiro mandato seja decidido por meio de consulta popular. “A proposta prevê assuntos como aborto, pena de morte, reforma agrária e reforma política. Não fala sobre terceiro mandato. Se for o caso, poderemos até proibir expressamente a possibilidade de convocação de plebiscito para decidir sobre esse assunto”, disse.

O tom da conversa foi ameno, com piadas e brincadeiras. Mas, ainda assim, Lula deixou claro que o deputado Devanir Ribeiro estava errado ao insistir que o povo precisa ser consultado se quer ou não o presidente mais quatro anos no Palácio. O presidente lembrou, segundo Chinaglia, que poderia ter ficado mais tempo no comando do PT e não quis estender o mandato. Teria dito ainda que nem mesmo os que soubesse que a idéia é exclusiva de Devanir fingiriam acreditar que existiu um acordo entre o deputado e Lula. “Todo mundo vai dizer que você combinou comigo”, afirmou Lula ao deputado.

Assim que Devanir, Berzoini e Chinaglia saíram de seu gabinete, Lula perguntou a assessores se a polêmica do terceiro mandato sumiria do noticiário. Os mais próximos apostaram no não. O debate se Lula querer ficar mais tempo no poder tende a continuar. Também enquadrado pelo presidente Lula, Ricardo Berzoini deixou a reunião ressaltando a posição contrária do PT em relação a um possível terceiro mandato para presidente, governadores e prefeitos. Apesar da morosidade em formalizar o posicionamento do partido, o presidente do PT negou que tenha adotado posição omissa sobre o assunto, alegando não achar necessária sua manifestação. “A posição contrária do partido em relação a outro mandato e a favor da alternância de poder foi definida na convenção. Não preciso ficar falando sobre algo que está claro para os integrantes da legenda”, argumentou Berzoini.

Os petistas reagiram. Em artigo publicado no site do PT, o secretário de Relações Internacionais do partido, Valter Pomar, afirmou que a proposta de convocar um plebiscito para o povo decidir sobre a re-reeleição não é golpista nem chavista. “Sou contra, mas não porque parece um golpe ou coisa de Hugo Chavez (presidente da Venezuela), mas porque se trata de uma opinião equivocada sobre as chances do PT sem Lula candidato em 2010”, afirmou Pomar.

Todo mundo vai dizer que você combinou comigo

Presidente Lula para o deputador Devanir Ribeiro, sobre a proposta do terceiro mandato

Partidos condenam re-reeleição

Não foi apenas o presidente Lula e os petistas convocados para a reunião no Palácio do Planalto que querem sepultar o debate sobre o terceiro mandato. Presidentes de seis partidos — PT, PMDB, DEM, PSB, PC do B, e PSC — se reuniram na tarde de ontem na presidência do PMDB para redigir uma nota na qual condenam a discussão. “Queremos que esta nota seja a pá de cal nesta discussão”, disse o presidente do PSB, Roberto Amaral.

O peemedebista Michel Temer foi quem articulou o encontro para lançar o manifesto contra a possibilidade de um presidente exercer três mandatos consecutivos. “O objetivo é enfatizar a tese de que a matéria não deve nem entrar em discussão”, afirmou Temer. Ele fez questão de colocar no papel não apenas a decisão, como as assinaturas de quem participou do encontro. “As palavras voam, mas o escrito fica”, justificou. Segundo a nota, a discussão compromete o clima de tranqüilidade e normalidade política e institucional do país.

Se o terceiro mandato foi consenso ontem, a discussão sobre o fim da reeleição, nesse momento, divide opiniões. Rodrigo Maia diz que o Democratas é a favor das regras como estão postas. “Melhor maturar o sistema que mudar outra vez”, avaliou. O presidente do PSB diz que a legenda é contra e vai lutar para acabar com o instituto. Já o petista Ricardo Berzoini prefere deixar o PT decidir se o fim da reeleição é prioridade ou não. “Não é apropriado falar em mudança de regra agora. Ano que vem tem eleição”, argumenta Berzoini.

Temer, por sua vez, aposta que o melhor momento para decidir se o Brasil mantém a reeleição é em 2008. “É o tipo da coisa que não podemos deixar para a última hora”, argumenta. Ontem, contudo, o único tema discutido foi o terceiro mandato. Temer diz que, agora, quem propor o terceiro mandato para Lula não terá apoio dos partidos.

FOME ZERO NO CHILE
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai fazer propaganda do programa federal Fome Zero durante a Cúpula Ibero-Americana, que será realizada em Santiago do Chile, nos próximos dias 8 e 10. Lula aproveitou o tema da cúpula deste ano sobre coesão social para propor a criação de um espaço para que os países possam apresentar seus melhores programas na área. Segundo o porta-voz da presidência da República, Marcelo Baumbach, Lula vai falar sobre o fato de o Brasil ter conseguido cumprir a primeira das Metas de Desenvolvimento do Milênio.

Mandato de cinco anos
A reação de Lula ao pedir ao trio petista o fim da discussão sobre o terceiro mandato no Congresso não convenceu integrantes da base aliada. O chamado bloquinho, composto por PCdoB, PDT, PSB e PMN, planeja apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) acabando com a reeleição e ampliando para cinco anos o mandato ainda este mês. A idéia é marcar a posição de que são veementemente contra garantir a Lula três mandatos consecutivos, e de que debates como esse só desgasta a relação entre os aliados, em especial o bloquinho que tem Ciro Gomes (PSB-CE) como candidato natural à presidência nas próximas eleições.

Estão dispostos a assinar a PEC, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), Márcio França (PSB-SP) e Paulinho da Força Sindical (PDT-SP). “Estamos dependendo de uma reunião”, revela o pedetista. Contudo, a proposta tende a não prosperar.

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, não vê possibilidade de incluir, na pauta de votações deste ano, a proposta que acaba com o instituto da reeleição ou a que trata de ampliação da duração do mandato presidencial. “Não vejo volume e importância política para (o assunto) ir à pauta neste ano”, afirmou Chinaglia, acrescentando que falta pouco tempo para o final do ano e a questão da reeleição é complexa. Mas, de acordo com o peemedebista Eduardo Cunha, o debate pode ganhar força na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Ele relatou mais de 30 propostas que mudam regras das eleições, entre elas as que pedem o fim da reeleição. “Este ano a gente vai discutir isso, mas acredito que só em 2009 o debate estará maduro para ir a plenário”, avalia Cunha.

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