Antes de embarcar para Caracas, na manhã de ontem, o Presidente Lula fez uma avaliação do impacto que o fim da arrecadação da CPMF terá sobre as obras programadas pelo governo. Lula amanheceu aborrecido com a condução que a coordenação política imprimiu à votação, cobrou responsabilidades, mas ninguém assumiu a culpa pela perda de R$ 40 bilhões do imposto do cheque. A cadeia de comando político do governo, ao final da avaliação, pode sofrer mudanças, em 2008.

Já na Venezuela, Lula evitou comentar o assunto e limitou-se a dizer: "Falo sobre isso amanhã (hoje). São coisas da democracia."

De acordo com os auxiliares mais próximos do Presidente, Lula em mais de uma ocasião disse que não votaria a CPMF "com a faca no pescoço", numa referência às exigências feitas por aliados do governo, mas só queria que a emenda fosse votada quando houvesse alguma margem de segurança para sua aprovação.

Nas proximidades do gabinete presidencial ora se dizia que o líder Romero Jucá (PMDB-RR) pronunciara as palavras fatídicas - "pode votar" -, ora que fora o ministro José Múcio Monteiro (Relações Institucionais), o senador Tião Viana (PT-AC) e até o novo presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), durante a visita ao presidente já na condição de sucessor de Renan Calheiros.

Jucá dispunha de ampla margem de manobra para adiar a votação, mas não lançou mão de nenhum recurso regimental. Na ironia fina de um auxiliar do Planalto, o líder do governo não quis recuar na palavra empenhada com a oposição de votar a emenda na quarta-feira. Afinal, seus compromissos seriam maiores com Renan Calheiros e o PMDB que com Lula.

Desde a véspera da votação, prevenindo uma eventual derrota, o Planalto desencadeara uma estratégia para preservar a imagem de Lula. A idéia era que o presidente, com R$ 40 bilhões em jogo, iria para o tudo ou nada no Senado, pois não estava disposto a pagar o preço exigido por alguns senadores e chamar a oposição à responsabilidade. Já seria uma estratégia com vistas às eleições de 2010.

O Presidente, que não é ingênuo, percebeu o tamanho do problema que estava se desenhando no Senado, a incapacidade de seus principais auxiliares de lidar com ele - Guido Mantega dizia que teria de tirar recursos do Bolsa Família, ou seja, cortar o próprio braço, como se a oposição fosse se sensibilizar com isso - e resolveu arregaçar as mangas para tentar reverter as expectativas para a votação.

Só isso explica a visita que fez ao governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda. O objetivo principal de Lula não era pedir a Arruda votos no Democratas, mas ter uma conversa que ele evitava havia mais de um ano com o senador tucano Marconi Perillo. Desde que chegou a Brasília, o ex-governador tentava uma audiência com Lula, que recusava por não perdoar Perillo por ter dito que o avisou sobre a existência do mensalão - uma mentira, segundo Lula.

O ex-ministro das Relações Institucionais Walfrido dos Mares Guia já havia recomendado a conversa, sob o argumento que o novo titular do cargo, Múcio Monteiro, usou para promover o encontro: Perillo teria grande influência sobre o líder do PSDB, Artur Virgílio, o mais intransigente dos tucanos a um acordo com o governo federal. Marconi votou contra a CPMF.

Até o meio da tarde de anteontem o Palácio do Planalto contabilizava efetivamente os 49 votos necessários para aprovar a CPMF - além dos 45 que registrados, na madrugada, no painel, havia pelo menos quatro tucanos a postos para engrossar as fileiras do governo. E pelo menos um senador do Democratas poderia ser acionado, se fosse necessário, pelo governador de Minas Gerais, Aécio Neves, que, a exemplo do governador de São Paulo, José Serra, articulou pela prorrogação do imposto do cheque. Um quadro que mudou rapidamente, sob o olhar impotente da articulação política do governo. Embora reclame, vários senadores avisaram o Planalto que a derrota era iminente. Um deles: Aloizio Mercadante (PT-SP).

Apesar de Múcio Monteiro ter feito acenos de paz ao Senado e à oposição, após a derrota, o humor de Lula e de auxilares diretos apontava noutra direção: a do endurecimento. Com os aliados e com a oposição. Com os primeiros, Lula está decepcionado. Dois exemplos, ambos do PR: César Borges e Expedito Júnior.

Lula mediou com Jaques Wagner posições para César quando ele trocou o DEM pelo PR da Bahia. O ex-pefelista votou contra a CPMF. Teria ficado amuado por não ter sido prestigiado numa solenidade da Ford, na Bahia. César, aliás, tinha a garantia de seu suplente de que não reivindicaria o mandato em razão dele ter mudado de partido. Com relação a Expedito, que exigia cargos na Petrobras e outros órgãos, a palavra mais suave que se ouve é "chantagem".

Há queixas também em relação a Romeu Tuma, que trocou o Democratas pelo PTB e sugeriu que votou contra a CPMF por ter feito um acordo com o DEM quando deixou a sigla. O senador paulista tem um filho no primeiro escalão do governo. O problema de Lula para "endurecer com os aliados" é que isso apenas deixaria a base de sustentação no Senado ainda mais fragilizada.

Encurralado por sua própria base de apoio - Mozarildo Cavalcanti, que não votou, tem uma antiga demanda com o Planalto por causa da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima -, Lula procurou a oposição. Mas ao final teria se dado contra, segundo o Planalto, que a PSDB e PFL não interessava discutir as necessidades do país, mas apenas impor uma derrota ao governo. Especialmente o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Lula vai cobrar da oposição todas as dificuldades pelas quais passar o país no regime pós CPMF.


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