Planalto espera “traições” de senadores da oposição


Governadores tucanos e do DEM estão do lado do governo para convencer indecisos a votarem pela prorrogação da CPMF até 2011

“Quem sabe o inesperado faça uma surpresa.” Trecho da música Eu e a Brisa, de Johnny Alf, a frase foi reproduzida ontem por um ministro próximo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para retratar o estado de espírito do governo em relação à aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC) que prorroga a cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) até 2011.

No Palácio do Planalto e nos gabinetes de aliados no Congresso, a análise corrente é de que o imposto do cheque só será renovado caso haja traições nas legendas oposicionistas. Por isso, há torcida pelo sucesso da operação deflagrada por governadores do PSDB. Ontem, por exemplo, o tucano José Serra (SP) ligou para senadores do partido pedindo voto favorável à PEC.

“Os governadores têm conversado. Aguardamos que isso produza frutos”, diz o ministro. Para ser aprovada, a proposta precisa do respaldo de 49 dos 81 senadores. Dos 53 parlamentares que integram partidos governistas na Casa, só 45 anunciaram voto a favor da prorrogação da contribuição. O presidente interino do Senado, Tião Viana (PT-AC), é favorável, mas só vota em caso de empate. Para tirar a diferença e correr risco menor de derrota em plenário, o governo aposta nas tais surpresas.

Leia-se: conquistar o apoio de cinco a 10 senadores da oposição. Figuram na lista, por exemplo, os tucanos Tasso Jereissati (CE), Eduardo Azeredo (MG), Cícero Lucena (PB), João Tenório (AL) e Lúcia Vânia (GO), além dos democratas Jayme Campos (MT), Jonas Pinheiro (MT), Adelmir Santana (DF) e Efraim Morais (PB). Além de Serra, assediam esse grupelho os governadores do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM), e os tucanos Aécio Neves (MG), Cássio Cunha Lima (PB) e Yeda Crusius (RS).

Arrecadação
Todos atuam em linha com o presidente porque a rejeição da CPMF provocará impacto financeiro também nos caixas estaduais. Segundo estudo do Ministério da Fazenda, São Paulo recebeu R$ 3,7 bilhões da arrecadação da contribuição entre janeiro e setembro. Ficará sem o dinheiro a partir do próximo ano caso o imposto seja extinto. Na quarta-feira, Lula também lembrou que, sem a contribuição, não terá como cumprir a promessa de destinar mais R$ 24 bilhões à área da saúde até 2011.

Se isso ocorrer, a Região Sudeste deixará de receber R$ 11 bilhões, conforme o Ministério da Fazenda. Além de reforçar a ameaça de repartir os prejuízos, o governo acredita que amealhará votos porque, quando a PEC chegar ao plenário, senadores deixarão de lado as determinações dos partidos para defender os interesses dos eleitores e dos grupos que os elegeram. Campos e Pinheiro, por exemplo, são representantes do agronegócio, que teve parte de suas dívidas renegociadas com a União.

Além disso, o governo estuda, em troca dos votos dos dois, repactuar uma dívida de R$ 5 bilhões de Mato Grosso com a União. A crença no palácio é a seguinte: entre a fidelidade ao partido e as conquistas que poderão apresentar às suas bases, Campos e Pinheiro ficarão com a segunda opção. Foi assim no caso do senador Pedro Simon (PMDB-RS). Depois de emitir sinais contrários à CPMF, ele fechou posição favorável à contribuição diante da promessa do presidente de ajudar o Rio Grande do Sul a superar grave crise financeira.

Na quarta à noite, Lula determinou à ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que passe um pente-fino em todas as dívidas da União com o governo gaúcho. Prometeu reparar as injustiças e acertas as contas pendentes. “Na hora da votação, a consciência prevalecerá”, afirma o ministro.

Lula diz que a direita não tem piedade
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que a direita não tem piedade, ao criticar os senadores da oposição que ameaçam votar contra a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Ele deixou claro também que vai cobrar dos governadores, caso a contribuição não seja aprovada, que eles visitem casa a casa para mostrar quem foram os senadores que votaram contra.

“Já apanhei o que tinha que apanhar, porque a direita não é mole. Vocês pensam que a direita é como a esquerda? Não. A esquerda faz um discurso aqui e vai embora. A esquerda é cheia de moralismo. Não pode falar da família, não pode atacar, não pode fazer isso. A direita não tem piedade”, afirmou o presidente durante discurso na cidade de Breve, na Ilha de Marajó (PA).

A cidade, de 95 mil habitantes, parou para o presidente. Feriado decretado pelo prefeito, mais de cinco mil pessoas foram à avenida Rio Branco ver Lula anunciar um programa de registro civil e concessão de terras para povos ribeirinhos. Mas o discurso esquentou mesmo quando no final, de improviso, o presidente decidiu falar da CPMF.

No palanque, ao lado da governadora do Pará, Ana Júlia Carepa (PT), Lula disse que os R$ 40 bilhões anuais da CPMF são imprescindíveis ao governo, que usa esses recursos para a Saúde e para programas como o Bolsa-Família. E mandou um recado: “Eles estão lá dizendo que vão votar contra (a CPMF), vão votar contra, achando que vão me prejudicar. Mas aqui, Ana Júlia, se eles votarem contra, temos que ir para cada casa mostrar quem é o senador responsável de deixar as pessoas sem os benefícios desses programas”, afirmou.

Lula voltou a dizer que “a campanha contra a CPMF é a campanha daqueles que gostam de sonegar”. “Porque a CPMF é aquele imposto do cheque que se a pessoa sonega a gente pega”, explicou à multidão, que enfrentou um sol escaldante por mais de seis horas para assistir o discurso do presidente.

Juízo
Segundo ele, se os senadores “tiverem juízo” vão aprovar a prorrogação da contribuição Lula fez questão de ressaltar que se caso o imposto do cheque seja rejeitado, só o estado do Pará deve perder R$ 1 bilhão em investimentos na área social.

“Se aprovarem, podem dizer para o povo que graças a eles (senadores) a gente aprovou recursos para ajudar os pobres desse país. Porque se fosse para ajudar os ricos, ninguém votaria contra”, afirmou Lula. “Porque cada centavo que a gente quer para favorecer os pobres é uma guerra”, completou.

O presidente terminou suas críticas ao Senado dizendo que “está mais experiente e muito mais tranqüilo”. “Estou muito mais senhor da situação, muito mais sabedor do que quero e do que posso fazer”, disse.

AÉCIO ADVERTE
O governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), reforçou ontem o argumento da responsabilidade do PSDB no processo de votação da CPMF. O tucano se reuniu com o presidente nacional da legenda, Sérgio Guerra (PE), e com o senador Eduardo Azeredo (MG). “Garanto a vocês uma coisa: nós vamos chegar unidos ao final desse processo. E acho que esse debate interno amadurece o partido. Nós somos um partido de quadros, um partido que tem responsabilidade para com o país. Não somos franco-atiradores, não queremos que este país viva um caos”, disse Aécio após o encontro.

Se eles votarem contra, temos que ir para cada casa mostrar quem é o senador responsável de deixar as pessoas sem os benefícios (sociais)
Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República

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