Vale-tudo na Câmara


A CÂMARA Municipal de São Paulo realizou a proeza de, na mesma sessão, aprovar um projeto que amplia o rodízio de veículos e outro que acaba definitivamente com as restrições à circulação de automóveis. Conseguiu assim produzir, além de uma contradição, mais descrédito para a desmoralizada instituição do Legislativo.
A aberração parlamentar foi resultado de um entendimento entre vereadores para a aprovação em massa de projetos. Em pouco mais de seis horas, os parlamentares paulistanos chancelaram em primeira votação 96 propostas, uma incrível média de 16 por hora, mais ou menos uma a cada quatro minutos -ou seja, não tinham a menor idéia do que estavam votando.

Numa autêntica política de cotas, cada um dos 55 vereadores teve direito à sanção de duas peças legislativas de sua autoria. Os que não puderam ser contemplados naquela sessão foram agraciados com créditos-projeto: poderão quando quiserem aprovar propostas suas independentemente do teor e sem discussão. A Câmara deverá reunir-se nesta semana para a segunda votação.

Quanto ao rodízio, o mais provável é que ele permaneça exatamente como está. Por paradoxal que pareça, muitas vezes nem os próprios vereadores estão interessados na realização dos projetos que apresentam. Como precisam apenas "prestar contas" a uma comunidade ou grupo de interesse, basta-lhes redigir a proposta e conseguir que a Câmara a aprove. Não faz muita diferença se ela é viável ou não, se o prefeito vai vetá-la ou se ela passará o resto da eternidade à espera de regulamentação para que possa ser posta em prática.
Lamentavelmente, os vereadores paulistanos não são os únicos a recorrer a essa farsa legislativa. O expediente é usado em várias Câmaras Municipais e Assembléias Legislativas.

Esses acertos negam a essência mesma do Parlamento, que, como o nome indica, foi criado para debater e resolver questões do interesse dos cidadãos. Todos os Legislativos tendem ao corporativismo. Apenas a vigilância da sociedade pode evitar os produtos mais absurdos dessa tendência, como o vale-tudo na Câmara paulistana.

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