Governo segura dividendo de estatais para fazer superávit


Há pelo menos três fatores que vão ajudar o governo a cumprir a meta de superávit primário deste ano, apesar da perda da CPMF: uma inflação ligeiramente maior do que a esperada anteriormente, o crescimento ainda robusto da economia - só com o chamado "carry-over" de 2007 já estaria garantido um PIB de 2,5% e, portanto, não será difícil chegar aos 4,5% estimados pelo Banco Central - e alguns bilhões de dividendos das empresas estatais que deveriam ter sido pagos à União em 2007, mas o governo determinou às suas companhias que deixassem parte dessa receita para este ano. Em 2007 havia arrecadação demais e as remessas de dividendos, estimadas originalmente em R$ 11 bilhões para o ano, estariam sobrando.

Até novembro de 2007 as estatais haviam remetido R$ 6,9 bilhões em dividendos, cifra muito aquém dos R$ 9,6 bilhões enviados ao Tesouro Nacional no mesmo período de 2006. O superávit de 2007, mesmo sem as receitas totais dos dividendos, ficou acima da meta de 3,8% do Produto Interno Bruto (PIB), fechando em torno de 3,9% a 4% do PIB.

"Nossa preocupação não é 2008, quando a perspectiva é mais tranqüilizadora. Estamos mais preocupados em assegurar a política fiscal de 2009 a 2011, primeiro ano do novo presidente da República", disse o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, ao Valor. Do presidente Lula, ele e Guido Mantega, ministro da Fazenda, receberam uma orientação clara: "Que montássemos uma equação que preservasse o bom ambiente de negócios que está levando os empresários a investirem e que tivéssemos muita cautela para não errar a mão, pois a boa situação da economia hoje decorre não só do ambiente externo favorável mas do impulso do mercado interno, movido sobretudo pela expansão do crédito." O aumento da alíquota do IOF sobre operações de crédito poderia funcionar como uma trava na oferta de crédito, mas a avaliação do governo é de que este continuará crescendo, talvez, num ritmo um pouco menor.

Há, segundo ele, o risco de a economia encerrar 2008 num ritmo de crescimento mais moderado do que ocorreu na virada de 2007 para este ano, advindo sobretudo de uma desaceleração substancial da economia americana, e se isso ocorrer, as contas fiscais para 2009 ficariam bem mais apertadas, exigindo uma equação diferente da que está montada agora.

O ministro já mapeou onde serão feitos os cortes de R$ 20 bilhões no orçamento deste ano, que serão negociados com as lideranças políticas na reunião de quinta-feira. "Vamos passar um pente fino na conta de custeio, nos projetos de investimentos de R$ 12 bilhões que estão fora do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e, se necessário, no PAC também. E vamos tentar fazer com que o Congresso nos ajude a espremer as emendas parlamentares", resumiu Bernardo.

Isso não significa, necessariamente, que os gastos objetos de cortes não serão realizados em hipótese alguma. Conforme o desempenho da arrecadação neste ano, as contas serão revistas. A hipótese de usar o 0,5% do PIB dos Projetos Pilotos de Investimento (PPI) existe há três anos, não foi necessário usá-la em 2007, mas está na mesa a possibilidade de lançar mão dessa conta neste ano. Ou seja, "não muda nada nesse aspecto", assegurou o ministro. No ano passado, dos R$ 16 bilhões destacados para o PAC, o governo conseguiu pagar apenas R$ 7,5 bilhões. Portanto, cortar alguma coisa no programa pode significar cortar apenas um desejo de investimentos.

Apesar das três válvulas de escape do Orçamento - um pouco mais de inflação, crescimento e dividendos das estatais - porém, o governo é obrigado a apresentar uma lista de cortes que torne o projeto de lei orçamentária equilibrado, premissa para que possa ser aprovado pelo Congresso. Bernardo não subestima as dificuldades que se colocam com a perda de R$ 40 bilhões ao ano, ou R$ 160 bilhões nos quatro anos que ele avalia. "Nunca vi, nos últimos anos, um problema orçamentário desse tamanho", comenta. E responde às críticas de que o governo rompeu um acordo com o Congresso de não aumentar tributos e que deveria ter deixado as medidas compensatórias da CPMF para fevereiro, quando do retorno dos parlamentares. "Esperar até fevereiro só ia fazer com as expectativas dos agentes econômicos piorassem, aumentando os juros futuros. Iríamos andar com pneu furado até lá na perspectiva de que a oposição, em fevereiro, iria nos ajudar. Eu comentei: a oposição vai nos ajudar a quê? A entrar na cova?"

Agir logo no início do ano, para o ministro, foi uma clara demonstração de que "há governo e de que é um absurdo se dizer que podemos ficar sem R$ 40 bilhões de receita por ano". Acusar o governo de estar aumentando a carga tributária também não é verdade, pois este perdeu R$ 40 bilhões e está repondo somente R$ 10 bilhões com elevação de impostos, argumenta Bernardo.

Outra questão delicada que se coloca agora é o que fazer com os acordos firmados no ano passado com várias categorias para reajustes de salários do funcionalismo público, mas que ainda não se tornaram leis. São mais de R$ 2 bilhões em reajustes nos três Poderes e dizer que não vamos cumprir esses acordos é "insustentável", avalia o ministro. A tendência, no governo, é de implementar cada uma dessas negociações paulatinamente, na medida do possível.


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