Pesquisa e prática inovadora, diferentes conceitos


Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os medicamentos que não constem na lista de drogas excepcionais do Ministério da Saúde (Anvisa), não devem ser custeados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) nem pelas seguradoras de saúde. O uso desses novos medicamentos foi classificado como "experimentação" e afastou a obrigatoriedade de seu custeio.

Essa decisão, embora lógica, acaba por não diferenciar os conceitos de "pesquisa" e de "prática inovadora". Tal distinção é de extrema importância, pois, sem ela, retardaremos o tratamento de pessoas que sucumbem perante várias doenças. Define-se "pesquisa" como um estudo com projeto bem estruturado, aprovado em comissões de ética, que inclui vários pacientes, desenhado para responder determinada pergunta e com finalidade modificar a ciência corrente.

Por outro lado, "prática inovadora" é a utilização de um conhecimento novo (como uma nova droga) para o tratamento da enfermidade de um determinado indivíduo, sem fundamentar-se em uma pesquisa, mas tendo chance razoável de sucesso. As pesquisas que mostram superioridade ou não-inferioridade entre o tratamento novo e o atual demoram a ser realizadas. Em grande parte das vezes elas jamais serão efetivadas, seja pela raridade da doença em estudo ou pela dificuldade financeira de se realizar uma pesquisa.

Os estudos de drogas novas são, em sua grande maioria, financiados pela indústria farmacêutica e não pelas agências fomentadoras de pesquisa ou pelos governos. Nem sempre a indústria pode ter como prioridade determinado estudo. Vale ressaltar que o poder público utiliza menos que poderia do respaldo científico para sustentar suas decisões. O Brasil ainda não conta com as instituições universitárias auxiliando amplamente os órgãos governamentais, principalmente no que diz respeito ao subsídio de informações técnicas. Por essa razão, muitas vezes nos deparamos com situações que não são compreendidas em sua totalidade pelo organismo público, o que acaba por retardar decisões ou torná-las inapropriadas.

No caso em questão, os hospitais públicos universitários poderiam responder à sociedade com informações sobre o potencial uso de novos fármacos. Assim, a criação de um Comitê de Práticas Inovadoras nestes hospitais, constituído por médicos notáveis e recebendo solicitações das diferentes especialidades, poderia trazer rapidamente a listagem de quais práticas são ou não reconhecidas pela comunidade científica como "inovadoras" e de provável sucesso. Esse relatório, constantemente atualizado, colocaria o Brasil em paralelo à assistência médica mundial dando, também, subsídios aos órgãos reguladores para determinar quais práticas devem ou não ser custeadas pelas seguradoras de saúde e em que condições.

O Ministério da Saúde já possui um comitê similar, a Comissão de Incorporação de Tecnologias, mas este órgão tem pouca agilidade e sem a possibilidade de receber solicitações continuadamente. Todavia, o cenário poderia ser modificado com a implementação de Comitês de Práticas Inovadoras em algumas instituições universitárias. Estes seriam responsáveis pelo crivo inicial das atividades terapêuticas propostas, restando à comissão ministerial apenas referendar, ou impossibilitar, as práticas previamente aprovadas nos comitês universitários. A idéia é audaciosa e poderia trazer contribuição inigualável à medicina brasileira e aos pacientes, que se beneficiariam dessas "práticas inovadoras" para tratamento.
Em 1979, a Comissão Nacional para Proteção de Indivíduos em Pesquisas Biomédicas, do governo dos Estados Unidos, editou o Relatório Belmont, tratando da questão de diferenciação dos conceitos de "pesquisa" e "prática inovadora". Esse relatório esclareceu que "o fato de um procedimento ser considerado experimental, pelo simples conceito de que é novo, não testado, ou diferente, não o coloca automaticamente na categoria de pesquisa".

Em 2007, o assunto ainda é polêmico e atual em nosso País e no mundo. Neste sentido, o Brasil poderia, ainda que quase trinta anos depois, tentar equacioná-lo de forma inteligente, visando beneficiar a assistência médica e a saúde de seus cidadãos, que padecem de doenças complexas e necessitam de terapias inovadoras.

Um comentário:

  1. Querida July,

    Gostei muito do seu post, bastante informativo e crítico.

    Meus parabéns!

    Att,

    Thomaz Nicoletti

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