Escutas telefônicas confirmam que os policiais de Suzano, na Grande São Paulo, mantiveram em cativeiro o estudante Rodrigo Olivatto de Morais, de 28 anos, enteado de Marcola, líder do Primeiro Comando da Capital (PCC). As conversas obtidas pelo Gaerco de Guarulhos mostram que os policiais entregaram a Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, o nome de um investigador, sabendo que o bandido estava disposto a matar quem o estava "ameaçando pela minha família". Gegê é o terceiro homem na hierarquia do Primeiro Comando da Capital (PCC).
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Segundo as investigações da promotoria, o enteado de Marcola foi seqüestrado em 30 de março de 2005. Às 16h53, ele telefonou para uma pessoa, identificada como Gaguinho, dizendo que havia sido preso. "Eu preciso falar com o Marcola, com o pai, com o meu pai", diz Rodrigo. Nesse momento, o enteado estava em uma sala nos fundos da delegacia. Os policiais exigiam R$ 1 milhão de resgate, mas aceitaram reduzir esse valor para R$ 300 mil. De acordo com as escutas, a delegada Maria Cristina Rachado foi incumbida pelo PCC de ir à delegacia e entregar o dinheiro do resgate.
O seqüestro de seu enteado foi uma das coisas que Marcola citou no dia 12 de maio de 2006 para policiais do Deic como razão dos ataques que ordenou e acabaram por paralisar o Estado. Os promotores descobriram que os telefonemas feitos pelo enteado de dentro da delegacia foram realizados por meio de um aparelho celular apreendido dias antes por Pena e seus colegas.
Trechos da conversa entre Maria Odette e Gegê:
Conversa do dia 24 de março de 2005
Maria Odette: Oi.
Rogério: Se lembra aquele pessoal que você fez acordo da última vez?
M: Que eu tinha?
R: Você fez acordo da última vez que o pessoal ficou preso.
M: Daquele que eu fui aquela vez?
R: Se lembra o pessoal do Levi? Se lembra?
M: Da onde?
R: Do Levi.
M: Lembro.
R: Do Levi, do Zé Carlos.
M: Sei, lembro, que que tem?
R: Vai se fuder.
M: Mas porque? São eles?
R: De ponta a ponta. Vou mandar cortar. É o seguinte. Depois é nóis.
M: Mas pera um pouquinho.
R: Eu não agüento mais.
M: Mas pera um pouquinho.
R: Eu vou mandar colocar uns fuzil na frente. Vou mandar cortar. Se eles quiser correr atrás, eles corre atrás depois. Eu não vou admitir mais desrespeito.
M: Tudo bem, mas foram eles que fizeram.
R: Porque tão me ameaçando pela minha família.
M: Mas eles que tão?
R: São eles mesmo.
M: Tem certeza?
R: Vou meter uns fura na frente. Vou mandar cortar.
M: Oh vida, você tem certeza?
R: Tenho.
M: Quem te falou?
R: Tenho certeza, meu.
M: Eu acho que você tá enganado.
R: Querem pegar minha família.
M: Eles não vão pegar família. Primeiro que aquele pessoal não pega de ninguém.
R: Não quero nem saber tio. Oh, se querem me mandar pra tranca, pode me mandar, que se eu tiver no grampo, que Deus abençoe. Vou mandar estralar e não quero saber de nada.
M: Não faz isso, vida. Espera. Vamos ver se é. Senão...
R: (.......)
M: Oh, vida, não faz isso.
R: Eu não quero saber, tio. Não fala da minha família.
M: Tudo bem, vida, mas quem que te falou. Você sabe se essa pessoa que te falou é ela mesma?
R: É ela, que ela até saiu de lá que eu vou mandar estralar agora.
M: E quem que é? Você sabe o nome?
R: Não posso falar.
M: Começa com que letra?
R: É o geral de lá.
M: Ah, não acredito, vida. Não acredito. Ele não tem isso.
R: E te conhece muito bem.
M: Me conhece?
R: Uh, uh.
M: Eu não conheço o geral de lá. Eu não conheço o geral de lá.
R: Tem investigador lá.
M: Também não conheço. O chefe dos tiras?
R: Meu.
M: Não conheço.
R: Vai estralar. Não tem boi. Tão querendo extorquir família, como ele extorquiu. Não tem boi.
M: Tudo bem, vida. Eu só acho que você tem que se certificar que é mesmo.
R: Nas últimas caminhadas (........) que teve acordo. Não tá pegando boi comigo. Não vai pegar bunda mole. Vou mandar estralar.
M: Eu vou te falar uma coisa.
R: É bom eles puxar na responsa. Eu não vou pegar boi. Não vai pegar boi comigo.
M: Tudo bem, vi. Tudo bem, cê tem razão, mas calma. Calma, será que é verdade? Será que quem tá falando com você é a pessoa mesmo.
R: Depois que estourar a garrafa, depois eu confirmo. Se não for verdade também ele vai segurar a responsa.
M: Mas não faz isso, vida. Não faz. Você é inteligente.
Conversa do dia 25 de março de 2005
Maria Odette: Alô.
Rogério: Alô.
M: Alô.
R: Alô.
M: Quem é?
R: Que tá acontecendo ai?
M: Ah. Pera um pouquinho, xodó. Peraí (tá te chamando aqui, oh). Pera um pouquinho só.
R: Que foi. Alô.
M: ...... Rogério?
R: Oi?
M: Oh, o que tá acontecendo é o seguinte. Aquela pessoa que me deu a informação usou a mim, usou os policias aqui, usou todo mundo, ta? E eu tô aqui, não sei nem se vão me prender ou não. Eles realmente têm o grampo de tudo, tá? (para o policial: Não quer você falar com ele?)
R: Quem ta ai?
M: Os policiais, aqui. Augusto...
R: Não, doutora. Não quero saber de policial. Quero saber, não tô entendendo o que tá acontecendo.
M: Tá acontecendo que eu vim saber daquele grampo que me informaram.
R: Hã?
M: Da Andréia e seu.
R: Hã?
M: E realmente o grampo existe, só que o policial que me deu a informação me usou, usou os policiais daqui, e agora tá tudo enterrado, entendeu. Eles vão me indiciar, vão indiciar todo mundo.
R: Falou o que?
M: Vai me indiciar aqui, sabem que ele me deu as informações.
R: Vai indiciar a senhora por que?
M: Ué, porque me deu a informação, porque eu ouvi o grampo dele, ta? Não sei nem se vão me prender ou não. Tem o grampo tudo, você a Andréia, mais não sei quem, um monte de gente deve ter. Realmente eu não sei o que vai acontecer. Ele queria falar pra você, que eu falasse pra você, que o canalha dessa história toda...
R: Mas eu não tenho idéia...
M: Foi o Jurandir.
R: Oh, doutora, eu não tenho idéia de quem é esse cara ai não.
M: Mas acontece que precisa esclarecer quem é que sacaneou quem.
R: Eu não quero esclarecer nada, doutora. Eu tô aqui. Se quiser que mandar alguma coisa eu tô aqui. Não tem para onde correr daqui.
M: Pera um pouquinho, só.
R: Não, o doutora.
M: Oi, pera só um pouquinho. Ele quer que eu diga para você que o canalha desta história foi o Jurandir, que é o policial do 41, ta?
R: Deixa eu falar um negócio pra senhora.
M: Hã?
R: Eu não conheço, não sei nem quem que é. Eu não tenho nada a ver com isso ai e outra, e o que que tem a ver o meu pessoal com isso ai?
M: Eu também não to entendendo, o Rogério, eles tão dizendo que vão me prender, eu to aqui, eles seguraram minha carteira, não querem deixar eu sair, entendeu? Porque o Jurandir me deu as fitas do grampo dele, que ele falou que tava o Cristiano, o outro lá, eles pegaram as fitas comigo e eu não tô entendendo também o que está acontecendo. Eu vim aqui para saber de uma... Você também não tem nada, não tem culpa de nada, mas eles querem que você saiba que quem foi o sem-vergonha na história foi o Jurandir.
R: Tá bom. Firmeza. Eu não tenho dúvida não, vamo que vamo.
M: Tá? É isso, pera um pouquinho (é isso, Araújo? Só isso?) Pera só um pouquinho, por favor.
(voz do policial ao fundo: fala pra ele ligar nesse 018 aqui)
M: Oi, Rogério.
R: Oi?
M: Ele quer falar com você. Dá pra você ligar no 018?
R: Não. Eu não vou falar. Não tem idéia com os cara não. Eu não vou falar com polícia não.
M: Não, mas é na boa. Na boa, Rogério. Por favor.
R: Não, mas eu não tenho idéia não.
M: Não, mas é na boa. Ele quer conversar com você na boa.
R: Não, o que ele vai falar pra mim?
M: Quem vai rodar nessa história aqui sou eu, Rogério. O cara me usou, entendeu, rodou, não sei nem se eu vou ficar presa ou não. Tô aqui esperando, ver o que eles vão resolver.
R: Eu não tenho idéia não, doutora.
M: Conversa com ele, Rogério, por favor.
R: Não tem idéia não, doutora.
M: Vê o que ele quer.
R: Não tem idéia não com esses cara ai não. Se tá onde? É ai no 44, ai?
M: Não, não é não, é em outro lugar.
R: Aonde é que é?
M: (pergunta para o policial: Pode falar?) Ele falou que, por enquanto, eu não posso falar aonde é.
R: Ah, o doutora...
M: Ele falou que se você ligar no outro ele fala com você e te explica. Liga pra ele, por favor.
R: Eu não tenho idéia com esses cara ai não, doutora. Já te falei já.
M: Tudo bem, mas por favor, só pra você ouvir o que ele tem pra te dizer.
R: O que esses cara tão querendo?
M: Eu não tenho idéia nenhuma. Eu não sei, Rogério. Eu também não to entendendo nada. O cara me usou, armou, e quem tá no meio da frigideira sou eu. Eu também não tô entendendo. Como você disse que eu sou ingênua, e sou mesmo, e dessa vez eu rodei. Liga pra ele, por favor, pra ele falar, ouvir o que tem a te dizer, não é idéia nenhuma. Não é idéia, só pra você ouvir o que ele tem pra te dizer. Talvez eu também entenda melhor. Por favor.
R: Qual que é o número. Me dá o número.
M: Porque quem tá mal nessa história toda sou eu. Eu fui usada e eu que fiquei mal e quem vai ficar presa sou eu.
R: Ficar presa por que, a senhora não tem nada a ver.
M: Ué, tem a ver porque eu tô com as fitas do grampo. Oi? (voz do policial ao fundo) Diz que a única coisa que pode me ajudar é você ligando ai para falar com ele. Você pode, por favor, ligar?
R: Fala o número ai.
M: 18
R: 18?
M: 9117-5769.
R: 9117-5769.
M: Isso. Por favor.
R: Falou.
M: Tchau.
Do Jornal O Estado de SP
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