Uma queda-de-braço entre o Palácio do Planalto e o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), está atrasando a concessão de reajuste salarial a cerca de 300 mil servidores públicos federais. Se dependesse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dos ministros Dilma Rousseff (Casa Civil) e José Múcio Monteiro (Relações Institucionais), o aumento seria baixado por meio de medida provisória (MP). Essa possibilidade existe e desponta como favorita na comparação com o envio de um projeto de lei ao Congresso. Só não saiu do papel devido à ofensiva verbal deflagrada por Chinaglia contra o suposto excesso de MPs editadas pelo presidente.
Segundo discursos entoados em público, Lula ainda não assinou a MP porque não quer confrontar os deputados. Nos bastidores, a versão é outra. O presidente quer que Chinaglia avalize previamente a MP dos servidores, assumindo o compromisso de não atacar o Planalto quando o texto chegar à Câmara. No cerco ao deputado, Lula conta com o apoio dos funcionários públicos, que se já reuniram com o parlamentar. Entre uma MP, que tem vigência imediata, e um projeto de lei, que só vale depois de aprovado pelas duas Casas do Congresso e sancionado pelo presidente da República, os servidores preferem a primeira opção.
“A solução será dada pelo deputado Chinaglia”, diz Múcio. Para facilitar um acordo, o governo fez uma proposta. Revogaria a MP que transformou em ministério a Secretaria Especial da Pesca e criou 295 cargos comissionados, ressuscitando-a, posteriormente, em forma de projeto de lei. Em troca, Chinaglia apoiaria a MP dos servidores. Se o pacto fosse selado, os dois lados ganhariam. O deputado poderia se apresentar como responsável pela derrubada de mais uma medida. Já o governo garantiria o afago aos servidores.
“Não importa a forma, mas o conteúdo”, afirma Múcio, referindo-se à possível substituição da MP da Pesca por um projeto de lei. De acordo com o ministro, a troca será feita assim que Chinaglia apresentar uma proposta alternativa que, ao fim e ao cabo, resulte na preservação do novo ministério e dos 295 postos cujo preenchimento independe de concurso público. Múcio não reclama da insistência do deputado em criticar as MPs. Lembra que a atitude está em linha com uma promessa feita pelo petista durante a campanha pela presidência da Câmara.
Outros assessores de Lula não são tão compreensíveis. Alegam que Chinaglia não age apenas em busca de uma marca para sua gestão ou em nome da autonomia do Legislativo. Adotaria uma postura independente como forma de alertar o Planalto sobre a necessidade de acomodá-lo num cargo de primeiro escalão tão logo concluído o seu mandato à frente da Casa. O nome de Chinaglia foi citado em conversas sobre possíveis sucessores de José Gomes Temporão no Ministério da Saúde quando este era alvo de fritura no Congresso e na Esplanada dos Ministérios. Agora, volta à mesa como talhado para assumir, por exemplo, o Turismo.
“O Congresso adora medida provisória. É mais fácil aprovar uma emendinha numa MP do que um projeto de lei”, afirma um ministro, sugerindo um quê de hipocrisia no coro contrário aos textos baixados pela Presidência. Chinaglia conhece as restrições feitas a ele no Planalto. Por enquanto, não dá sinais de que pretende mudar de postura. Entre outros motivos, porque marca pontos internamente com o discurso de defesa do Congresso. O deputado também atira nos governistas. Recentemente, atacou a iniciativa de Lula de propor uma reforma política, assunto que seria da alçada dos parlamentares.
Servidores mobilizados para pressão
Luciano Pires
Os sindicatos decidiram romper o silêncio e sair do imobilismo. Como forma de pressionar o Executivo a finalmente liberar os reajustes para o restante do funcionalismo federal, entidades que representam as 54 carreiras que serão contempladas com aumentos salariais farão protestos hoje e amanhã. As ações incluem atos públicos, paralisações de 24 horas e redução de jornada de trabalho.
A maior parte das entidades elegeu o Ministério do Planejamento como alvo. Os blocos K e C da Esplanada foram escolhidos como pontos de referência para os grupos que prometem se organizar. “O pessoal está ansioso. Pode até não ter clima para greve, mas tem para protesto”, disse Josemilton Costa, secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef).
Ontem, representantes dos servidores que compõem as chamadas carreiras típicas de Estado retomaram o lobby político. No Congresso, foram recebidos pelo presidente do Senado, Garibaldi Alves. Segundo um dos participantes, o senador se mostrou sensível à causa e prometeu empenho. “Ele até ligou para o ministro Paulo Bernardo (Planejamento)”, disse um sindicalista. Garibaldi teria ouvido de Bernardo que as medidas provisórias com os reajustes para os cerca de 300 mil servidores seguirão para a Câmara no início da próxima semana.
Desconfiados, os sindicatos das carreiras estratégicas não desmobilizaram suas bases. Ao contrário. Advogados públicos, servidores do ciclo de gestão, do Fisco e do Banco Central resolveram em assembléias que vão realizar amanhã paralisações e atos de repúdio à demora do governo em resolver a questão.
O ministro Paulo Bernardo cumpriu uma extensa agenda institucional ontem. No Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, antes de entrar para um a reunião, disse ao Correio que os aumentos “vão sair” e desqualificou teses e boatos que circulam na Esplanada dando conta de que os reajustes empacaram.
Em meio à crise instalada entre os poderes e entre o governo e os servidores, as áreas técnica do Ministério do Planejamento e da Casa Civil, até ontem, revisavam os termos de acordo assinados com as categorias.
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