Abre o olho PT


Custa a crer que o PT e o Planalto apostem todas suas fichas na tese de que a candidatura do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), naufragará porque unicamente calcada na crise econômica. A questão não é se petistas ou tucanos estão certos sobre a velocidade com que os indicadores se recuperarão. O ponto é outro. Só o alheamento do que ocorre sob as ordens de Serra em São Paulo pode levar a crer que todas as suas fichas estão na curva do Ibovespa.

Uma panorâmica sobre as iniciativas de seu governo é um claro indicativo de que a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, terá dificuldades de expor as vitrines do governo Luiz Inácio Lula da Silva sem um concorrente à altura na experiência paulista. O governador de São Paulo tem uma marca definida na Saúde junto ao eleitor brasileiro. E usa esta gestão para imprimir marcas em outros setores - não necessariamente em confronto com a administração federal.

Na Educação, Serra chamou para a briga o mais eficiente ministro da Esplanada, Fernando Haddad, com a nomeação do deputado federal Paulo Renato Souza (PSDB-SP) para a Pasta estadual. O ex-ministro do governo Fernando Henrique Cardoso não poderia ter sido mais claro em seu discurso. Assumiu o cargo em cumprimento de uma missão partidária que não é outra senão evitar que Haddad propague, sem concorrência, as melhores bandeiras do MEC em favor da candidatura lulista.

Haddad garante para Dilma a fatura do Prouni, da expansão de vagas nas universidades federais, da reintrodução das escolas federais profissionalizantes e agora da revolução prometida com o fim da indústria do vestibular. Paulo Renato que, no governo Fernando Henrique Cardoso, também foi um ministro acima da média, vai gerir iniciativas inovadores do governo paulista como o pagamento de bônus aos professores da rede pública estadual e a expansão do sistema Paula Souza, escolas profissionalizantes de excelência do Estado. E, como já demonstrou no debate sobre o uso do Enem para o acesso ao vestibular, vai cumprir o papel de não deixar Haddad sozinho na ribalta.

Na Saúde, aproveita para tomar iniciativas como a lei antifumo que, a despeito da gritaria do PT, ajuda a firmar a imagem de governante que enfrenta interesses em defesa da maioria silenciosa, como aconteceu na lei Cidade Limpa. Uma ampla campanha publicitária já está em curso para divulgar a imagem do governador, mais uma vez, como paladino da saúde pública.

Enquanto os petistas tentaram argumentar em vão contra o autoritarismo embutido na medida, tiveram dificuldades de se desvencilhar da defesa de interesses corporativos de donos de bares e restaurantes e trabalhadores da categoria em detrimento da maioria. Para completar, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, elogiou a medida e disse que o Planalto tem um anteprojeto de lei, já na Casa Civil, pronto para ser enviado para o Congresso replicando o modelo paulista para o resto do país.

Na política tributária, também se escreve um capítulo da novela que Serra, o destemido, pretende estrear em 2010. Com a substituição tributária, cobrança antecipada do ICMS na indústria, que tem tido bons resultados no combate à histórica sonegação do varejo, o governador escolheu um alvo de claríssimo apelo popular.

Pode vir a sofrer um desgaste junto aos comerciantes, mas, em compensação, faz bonito junto ao consumidor. E, enquanto o presidente da República não se cansa de criticar sua Polícia Federal e chancelar calotes a rodo que o Congresso aprova, Serra autoriza seu secretário da Fazenda a se comprazer com a operação que levou a dona da Daslu novamente em cana, a pedir mais punição e a clamar pela crucificação dos sonegadores.

O que a campanha petista vai dizer quando a propaganda eleitoral de Serra colocar na TV um moço simpático, com pinta de estudante esforçado do ensino médio, com o seguinte texto na ponta da língua: "Por que o governo Lula derrama tanto dinheiro do BNDES, que é dinheiro do povo brasileiro, em empresas que, no primeiro aperto, já demitem trabalhadores?".

Serra arma-se de antídotos contra o discurso de que ele é ameaça à herança do presidente mais popular da história do país. Tome-se, por exemplo, a política de salário mínimo paulista. A partir de 1º de maio, o menor salário pago em São Paulo será de R$ 505, um aumento de 12,2%, um ponto percentual a mais que o reajuste do salário mínimo federal que passou para R$ 465.

O mínimo paulista beneficia 1 milhão de pessoas. O federal arrasta consigo o interminável debate do déficit da Previdência. Se Serra, eleito presidente, incrementará uma política de valorização do salário mínimo que pressiona cada vez mais esse déficit, é uma história que ainda está para ser contada, mas discurso para enfrentar o poderoso instrumento de elevação do poder de consumo popular do governo Lula, isso ele já tem.

Se a crise econômica não será suficiente para eleger Serra, terá sido, pelo menos um empecilho a que Dilma desfralde com galhardia a bandeira da eficiência administrativa embutida no bem-sucedido modelo da concessão das rodovias federais. O modelo garante, sim, um pedágio mais barato do que o cobrado nas rodovias paulistas, mas isso quando as estradas forem construídas. A crise internacional provocou retração na capacidade de investimento das empresas e as prometidas rodovias ameaçam permanecer como grandes canteiros de obras em 2010. O modelo de outorga onerosa de São Paulo cobra tarifas cada vez mais escorchantes, mas as estradas estão aí e não há quem passe por elas sem achar que não há nada parecido no Brasil.

Sim, é verdade, o PCC sempre pode aprontar numa véspera de eleição; o tatuzão, a gigantesca escavadeira que já está beirando o subsolo da Av. Paulista, no célere canteiro de obras do metrô, não está livre de abrir outras crateras na imagem da administração tucana; e as desavenças irreconciliáveis do funcionalismo público com o governo Serra são uma ameaça constante de greves gigantescas na polícia, educação e transporte.

Fatos como esse podem mudar o rumo de uma eleição. Confiar neles para definir a parada parece tão imprudente quanto acreditar que o irrequieto governador paulista está de braços cruzados esperando o mundo acabar para virar presidente da República.

Maria Cristina Fernandes

Um comentário:

  1. Muito bom post, Juliana. No entanto, há inúmeros episódios que podem ser explorados pelo PT para demonstrar, inequivocamente, que os fatos não correspondem aos decretos do palácio do governador. Os índices obtidos por professores e alunos em provas de avaliação é um exemplo, depois de tantos anos de governo tucano. Outro ponto é a venda da nossa caixa em época de recessão, que poderia ter efeito de dinamizar a economia paulista, como diz Aluisio Mercadante.

    Vou reler o texto, pois realmente é necessário não subestimar o adversário para que, então, sejamos mais uma vez felizes, sem medo.

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