O superpromotor de Nova York para combate ao colarinho branco e à corrupção acha difícil entender por que no Brasil políticos ladinos são processados pela Suprema Corte, não pela Justiça comum. "A democracia pressupõe que as pessoas são julgadas em níveis iguais. Se você é um cidadão comum e vê que o sistema favorece os políticos você perde a confiança nesse sistema", adverte Adam Kaufmann.
Também o intriga a morosidade que marca os processos judiciais sobre ocultação de recursos ilícitos. "Alguém me disse que aqui (no Brasil) um processo de lavagem demora 10 anos, 20 anos, é incrível!"
Adam Kaufmann veio a São Paulo participar de um importante encontro de promotores e magistrados. Ele é o chefe da Divisão de Investigação da Promotoria do Estado de Nova York. Sob seu comando movimenta-se poderoso núcleo de promotores, 100 profissionais do Ministério Público.
Kaufmann é famoso e prestigiado em seu país pela obstinação na caçada a corruptos. Mira contas por onde transitam tesouros dissimulados, fortunas de origem desconhecida porque à sombra de documentos forjados e testas de ferro de paraísos fiscais.
Seu raio de ação vai além das fronteiras. Faz parte de sua rotina, por exemplo, rastrear valores depositados em instituições financeiras americanas por políticos de outros países, como o Brasil. Um de seus alvos está outra vez aí na TV e no rádio. Todos os dias, com mil promessas ao eleitorado. É Paulo Maluf, do PP, em campanha pela reeleição à Câmara. Contra Maluf a Justiça dos Estados Unidos expediu ordem de prisão, a pedido de Kauffman.
Ao Estado, ele recomendou transparência, cobrou decisões finais da Justiça e falou de ficha limpa, uma lei que em seu país não existe. "Nos Estados Unidos se um político comete um crime os próprios colegas o excluem do partido. Vocês (o Brasil) não têm isso."
(À noite, Adam Kaufmann, 45 anos, embarcou de volta à sua América. Planeja tirar duas semanas de férias com a mulher, também promotora de carreira. Depois, retoma o dia a dia de desafios e procedimentos sobre casos emblemáticos).
Políticos são investigados em seu país?
São investigados por lavagem de dinheiro, corrupção, outros crimes. A corrupção é diferente, ela acontece silenciosamente. Leva muito tempo para ser identificada. Tenho trabalhado no Brasil com promotores e juízes por seis anos e com sucesso. Há algumas áreas específicas que acho frustrantes. Por exemplo: a ideia de que políticos só são julgados pela Suprema Corte e não pela Justiça comum. Outro aspecto é o veredicto final. É preciso encerrar os processos por corrupção de forma rápida. Todo mundo com quem eu falo no Brasil diz que só pobre vai para a prisão. Isso era verdade também nos Estados Unidos. Isso mudou.
Como?
Tivemos a compreensão de que pessoas que roubam milhões de dólares com a caneta, pessoas que vendem sua influência, oferecem tanto perigo quanto alguém com uma arma na rua. As pessoas têm que ter a confiança e a certeza de que aqueles que cometem crimes vão para a cadeia. Alguém me disse que aqui um processo de lavagem de dinheiro demora 10 anos, 20 anos, é incrível! Se for isso mesmo não funciona.
Como evitar a escalada da corrupção no período eleitoral?
Com transparência. Doação de campanha a gente supõe que seja pública, não seja fechada. Se eles (políticos) não declaram ou se eles escondem pode ser crime. Se alguém faz grande doação de campanha e o político não abre, não declara, isso vai ser crime. Há um juiz famoso no meu país que uma vez disse: "A luz do sol é o melhor desinfetante". Quanto mais transparência, quanto mais aberto for, pior para a corrupção.
Maluf é candidato novamente. Isso o decepciona?
Não. Eu investiguei o sr. Maluf. Ele foi acusado em Nova York por crimes em Nova York, não no Brasil. Depois de 16 anos de promotoria é difícil me chocar. Eu acho que as instituições têm que crescer. O Brasil é uma democracia muito jovem e as pessoas que eu conheço, os promotores e os juízes, eles tentam conferir maturidade às instituições. O Brasil é um grande parceiro. Encontrei promotores e juízes que são dedicados e que trabalham duro, que querem fazer as coisas acontecer.Estado
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